São Paulo, Sábado, 19 de Junho de 1999
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SARNEY NO CINEMA
Livro tem cheiro, magia e muito sexo

Divulgação
Lagoas do Parque Nacional de Lençóis Maranhenses, local onde aconteceram as histórias de "O Dono do Mar"


especial para a Folha

Ninguém espera que da figura anacrônica, de bigodes histriônicos, com o estilo jaquetão de governar, saia uma obra que tem cheiro, magia e muito sexo. Mas logo no primeiro capítulo de "O Dono do Mar" (Siciliano, R$ 24,50, 282 págs.) há indícios do que vem pela frente.
Jurumenho, numa festa, arrasta Dina, uma mulher casada, para "embaralhar as partes". "Ela vem. É tudo que se pensa e deseja. Jurumenho, nas suas forças, força. E vai e vem. E vem e vai. Ela geme. Bem perto estão a festa e o marido. É tudo alegria, e ela quer conhecer o desconhecido."
Carideno, o marido infiel, flagra o casal e mata Jurumenho. O capitão Cristório, pai de Jurumenho, vinga o filho, mata o marido, obriga a mulher a tirar a roupa e diz: "Mulher, abre as pernas, cadela do azar. Eu vim terminar o que Jurumenho começou!".
Conflito que tem se traduzido como a essência do jogo político brasileiro, pode o estilo do autor ser comparado às mumunhas para se manter no poder? Como julgar com isenção a obra de alguém que pontificou o universo dos burocratas? Como escreveu Jorge Amado, "José Sarney é um escritor a quem o político José Sarney tem causado graves prejuízos".
Sarney construiu uma narrativa que cheira a alfazema e caju. Fantasmas de náufragos num mar invocado, onde mais de 600 navios já foram a pique, aparecem à noite.
O mar constrói amigos, dá um sentido à vida. Seus entes atormentam os pescadores, como os piocos, monstrengos de um só olho que lançam luzes de fogo, que levaram a amada de Cristório, que "tem um trato com o mar".
Poucos escritores brasileiros criaram imagens com tanta cor. Poucos se aventuraram a penetrar no universo do desconhecido, das lendas, do mágico. "O Dono do Mar" é livro que deixa o leitor perplexo, excitado e desconfiado: "Isso existe, ou fui envenenado pelas experiências literárias do autor?"
(MARCELO RUBENS PAIVA)


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