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"Quis um filme em que o inconsciente fosse cenário"
JEAN-MICHEL FRODON
DO "LE MONDE"
"O inconsciente é um território cheio de contradições, misterioso", diz Woody Allen. Leia abaixo trechos da entrevista em que o diretor comenta o "cenário" de seu mais recente filme no Brasil, "O Escorpião de Jade".
Pergunta - Por que você situou "O
Escorpião de Jade" nos anos 40?
Woody Allen - Sempre tive vontade de fazer um filme no estilo
daqueles que eram populares
quando era jovem. Toda semana,
o cinema da esquina apresentava
um novo filme do gênero, com
uma intriga criminal misturada à
história de um homem e de uma
mulher que se detestam, com diálogos rápidos e sofisticados.
Pergunta - Originalmente o seu
personagem era um policial. Por
que se tornou agente de seguros?
Allen - Não posso interpretar um
tira, você sabe (ele estremece e coloca em evidência seu porte).
Queria trabalhar menos como
ator, para me dedicar mais à direção. Mas voltarei a desempenhar
o papel principal no meu novo filme, "Hollywood Ending". Não teria como escapar a isso: um cineasta nova-iorquino neurótico
enfrentando a indústria do cinema de entretenimento.
Pergunta - O filme retoma uma
oposição que lhe é cara entre o intelecto e o instinto, sempre vencida pelo segundo.
Allen - Na criação, prefiro apostar no instinto, mesmo que ele
não vença sempre, do que em
uma reflexão que semeia armadilhas e na qual me deixo manipular
por elementos exteriores.
Pergunta - Isso ocorre no filme?
Allen - O personagem interpretado por Helen Hunt parece muito reflexivo, mas há algo mais lá,
algo mais profundo, nascido do
medo que ela sente. O inconsciente é um território cheio de contradições, misterioso. A psicanálise
permite um mergulho em si mesmo, para que a pessoa entre em
contato com seu inconsciente,
mas, quando se chega ao fundo, é
algo duro e complexo, o substrato
rochoso de uma personalidade.
Tentamos escavar, mas ele resiste.
Sempre quis fazer um filme situado no inconsciente, em que o inconsciente fosse o cenário.
Pergunta - "Neblina e Sombras"
não se passava no inconsciente?
Allen - Sim, por certo, mas se tratava acima de tudo do inconsciente do século 20 e do inconsciente
do cinema também. Queria representar o inconsciente de uma pessoa, o que é complicado no plano
visual. A sequência de sonhos
criada por Dali para a "A Casa do
Dr. Edwards", de Hitchcock, é
muito artificial. Eu prefiro o sonho filmado por Buñuel em "Los
Olvidados", muito orgânico, em
simbiose com o resto do filme.
Tradução Paulo Migliacci
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