São Paulo, sexta-feira, 19 de julho de 2002

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MÚSICA

"Samba de Monalisa", lançado na Inglaterra e nos Estados Unidos, tem participação da francesa Sophie Calle

Tetine faz paródia de clichês eletrônicos

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Toda vez que descobrem na Europa que ela é brasileira, a proposta é inevitável: "Brasil? Ah, então samba aí pra gente ver...".
Eliete Mejorado, 34, o alvo desses pedidos, irritou-se tanto com a frequência deles que decidiu traduzir o desconforto de ser brasileira e não corresponder ao clichê no disco "Samba de Monalisa", lançado na Inglaterra e nos EUA. Assinam o disco o duo Tetine, formado por ela e Bruno Verner, 30, e Sophie Calle, 49, uma das mais importantes artistas contemporâneas da França.
Sophie tornou-se famosa a partir dos anos 80 por usar sua vida em obras ficcionais. É tão personagem em seus trabalhos que virou personagem do escritor americano Paul Auster no romance "Leviatã" (1992).
"Samba de Monalisa" é feito dessa mesma matéria-prima: a confusão entre artista e personagem. O disco foi feito com diálogos extraídos do filme "No Sex Last Night" (1993), dirigido por Sophie Calle e seu namorado à época, Greg Shephard.
O filme narra a viagem de Sophie e Greg entre Los Angeles e Nova York, registrada de forma dupla -cada um viajou com uma câmera. É um "road movie", gênero americano por excelência, feito por uma francesa que presta tributo e debocha dos EUA ao mesmo tempo. O título do filme é uma das frases repetidas por Sophie sobre sua relação com Greg -"No Sex Last Night", dito desta forma macarrônica. Nunca se sabe se ela está debochando da obsessão americana por sexo ou se é tudo verdade.
Atriz formada pela Unicamp, Eliete trabalhou com Moacir Goés ("Eduardo 2º"), e Marcio Aurélio ("Algo em Comum") e não renega esse passado. Música e performance têm o mesmo peso na balança, segundo ela. Os procedimentos cênicos não se limitam ao palco; são introjetados na música, também.
A primeira providência do Tetine foi colocar sexo nas histórias cantadas para colocar em xeque a atitude francesa de "no sex". "É tudo verdade, mas é maquiado de um jeito que você não sabe o limite entre o real e a esquizofrenia. É mais ou menos como me vejo nos sonhos", descreve Eliete.
O Tetine é sempre definido como um duo de música eletrônica e performance, mas no caso de "Samba..." o que há é uma paródia dos clichês que dominam a música eletrônica. É um groove de quem não samba, é samba para gente dura, "metáfora do samba pré-fabricado para inglês ver", como diz Eliete.
Ela e Bruno vivem na Inglaterra desde 2000, onde foram com uma bolsa da Queen Mary University para auxiliar num curso sobre o dramaturgo Nelson Rodrigues. Em Londres, apresentaram a versão performance de "Samba de Monalisa" na galeria de arte Whitechapel, a mesma que lançou Hélio Oiticica e Lygia Clark na arte internacional. Talvez seja puro acaso, mas em 1997 o Tetine fez um tributo em forma de performance a Hélio e Lygia.
As pretensões do Tetine são mais modestas. Querem trazer a performance para o Brasil e já estão em negociações com o Instituto Cultural Itaú. Eles não se incomodam em limitar o raio de ação do Tetine a galerias de arte. Sabem que o mercado musical virou um monolito conservador.


SAMBA DE MONALISA -
Artista: Tetine.
Lançamento: Sulphur Records.
A partir de 25/7, o CD será vendido na Bizarre (tel. 0/xx/11/3331-7933). Quanto: R$ 35 (em média).



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