São Paulo, sexta-feira, 19 de outubro de 2001

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CINEMA/ESTRÉIA

Ator de "O Xangô de Baker Street" fala sobre o filme brasileiro, que chega hoje ao Rio, Brasília e Lisboa

Português sua a camisa como Sherlock

FRANCESCA ANGIOLILLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Ter atuado em mais de 50 filmes desde sua estréia no cinema, em 1980, é algo que, em parte, Joaquim de Almeida, 44, atribui à sua capacidade de representar em cinco idiomas -português, inglês, francês, espanhol e italiano.
No entanto, a versatilidade linguística não salvou o ator português de suar a camisa para encarnar Sherlock Holmes em "O Xangô de Baker Street", produção baseada no livro homônimo de Jô Soares, que estréia hoje no Rio, Brasília e em Lisboa e, em uma semana, chega a São Paulo.
Suar a camisa, literalmente: falar a língua natal como se fosse um inglês do século 19 e, pior, vestido como um inglês do século 19, em pleno verão carioca, foram as maiores dificuldades que o ator diz ter enfrentado nas rodagens do longa de Miguel Faria Jr..
"Aliás, o Sherlock acha muito estranho as pessoas vestirem-se à européia num país tropical, daí ele usar o linho", diz Almeida, comentando a passagem em que o detetive resolve adotar o tecido "popular", desprezado pela alta roda, na tentativa de tornar mais confortável sua tradicional indumentária, de capa e chapéu.
Falando à Folha de Lisboa, onde estava para a pré-estréia da produção, Almeida conta que foi "curioso" o convite para viver um Sherlock Holmes tão particular.
"Tinha chegado de Nova York [onde vive" a Lisboa, estava a desfazer as malas, liguei a televisão e vi o Jô Soares, que estava a dar uma entrevista no noticiário, porque estava cá para o lançamento do livro. Eu não o conhecia bem. Ele disse que já tinha vendido os direitos do livro para fazer um filme e que gostaria que fosse Joaquim de Almeida a fazer o Xangô. Eu fiquei muito surpreendido."
Para entrar nas vestes do Sherlock-Xangô do livro, Almeida se baseou na sua experiência de fã do detetive criado por Arthur Conan Doyle. E, enquanto filmava outra produção no Canadá, estudou o inglês da época com um professor. "A outra parte que eu tive de trabalhar foi o português do Sherlock Holmes."
"Eu pensei: "Ele é inglês, escolhe as palavras. E era uma época diferente, as pessoas falavam mais pausadamente. O português de hoje fala-se muito rápido e é por isso que vocês têm dificuldade em entender-nos, às vezes", conta, explicando porque foi difícil falar a própria língua no filme.
Almeida conta que não usou suas impressões de estrangeiro em visita aos trópicos para reproduzir o espanto de Holmes diante do Rio de 1886. "Até porque, na primeira vez em que fui ao Rio de Janeiro, fui com um amigo meu, que foi assaltado em Copacabana, e eu não corri atrás de quem o assaltou, ao contrário de Sherlock."
Na trama, o detetive desembarca na corte carioca de d. Pedro 2º, sempre com seu fiel Watson (Anthony O'Donnel), por sugestão da atriz francesa Sarah Bernhardt (a também portuguesa Maria de Medeiros), amiga do imperador.
Sua missão é ajudar a encontrar o violino Stradivarius de uma baronesa, o qual parece misteriosamente ligado a uma onda de assassinatos de mulheres.

Fidelidade
Quem leu o livro nota a fidelidade do roteiro, de Miguel Faria Jr. e Patrícia Melo. Almeida concorda: "O filme é muito fiel ao livro, mas é evidente que, para ser completamente, teria de durar seis horas. Eu acho que Miguel escolheu muito bem as cenas que eram mais cinematográficas".
Entre as cenas mais divertidas que passaram para a tela, estão as que se referem à adaptação do detetive aos hábitos brasileiros. Holmes se dedica à tarefa com afinco, apesar do espanto inicial.
"Ele é muito "british". Eu tentei usar, sobretudo, aquela coisa dos ingleses, que sempre acham que tudo é muito estranho."
Se não usou sua própria visão de estrangeiro, Almeida se valeu da colaboração de seu caro Watson. "Ajudei o Tony [O'Donnel" a entender um bocado da sociedade brasileira, porque ele sentia-se perdido não falando português, e ele ajudou-me com o inglês e na composição do personagem."
Os R$ 10 milhões gastos na produção se refletem em seu apuro técnico, que Almeida também ressalta. Constatando que a produção de Faria Jr. "não deve nada a filmes feitos em outros países", estuda roteiros para voltar a rodar aqui em 2002: "Para o ano, espero estar no Brasil a filmar outra vez".


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