São Paulo, Sexta-feira, 19 de Novembro de 1999
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"RENT"

Musical é uma vitória

da Reportagem Local

Mark (um desenvolto e talentoso Daniel Ribeiro), espécie de narrador ou até corifeu em "Rent", atravessou o primeiro ato quase sem voz, nas passagens de canto.
No segundo, sabe-se lá como, achou. Como essa, outras imperfeições pontuais foram surgindo na apresentação do musical, domingo passado.
Era a segunda sessão do dia, encerrando uma semana de maratona para os jovens atores, inexperientes nas exigências físicas e emocionais do teatro musical americano. Com todas as suas imperfeições, "Rent", a versão brasileira do fenômeno da Broadway, terminou e era uma vitória inconteste.
Pouco a pouco, as eventuais dissonâncias, o estranhamento do verso traduzido, os equívocos na transposição dos figurinos: tudo foi suplantado, primeiro, pela fascinante história de amor e morte. Depois, pelo envolvimento dos intérpretes, levados uns pela música, outros pelos diálogos, pela contracenação.
Assim, se quadros como o da canção "La Vie Bohème" se confundiram no barroquismo de referências, outras cenas, como em "Out Tonight", trouxeram revelações não notadas no próprio original nova-iorquino.
Quem descrevia "Rent" como um fenômeno, no mesmo domingo, era o "New York Times". O que intriga no êxito continuado do musical, que estreou há mais de três anos, Off Broadway, com temática aparentemente restritiva, é como conseguiu enfrentar e se manter, já na Broadway, diante de usinas de marketing tipo "The Phantom of the Opera".
Uma resposta está na montagem brasileira: "Rent" é também uma usina, abrindo franquias de comportamento. A outra resposta está no próprio palco: Jonathan Larson, libretista, compositor e letrista, ergueu uma história de amor tão efetiva como um "Romeu e Julieta".
Como prova o espetáculo brasileiro, nem é preciso ser romântico para se deixar tomar por Roger e Mimi (respectivamente Robson Moura e Andrea Marquee, artistas mais completos em cena) em seu amor asfixiado pela perspectiva da morte.
Outras histórias de amor se intercalam, como que para sublinhar, em contraponto, a primeira: o professor negro Tom Collins e a drag queen Angel (Maurício Xavier e André Dias, ambos de grande presença cênica); e duas mulheres, a "performer" com ares de diva Maureen (Alessandra Maestrini, comediante que mais se destaca no elenco) e sua produtora, Joanne (Neusa Romano, a melhor cantora).
É preciso falar com vagar de um problema. As letras das canções são, na visão de muitos, a essência do teatro musical: são elas que fazem a ponte entre dramaturgia e música. E as versões criadas para "Rent" pecam por tentar manter a todo custo as imagens e referências originais -o que o português não permite, se alinhado aos monossílabos ingleses.
O verso fundamental do musical é "no day but today" (algo como "não existe outro dia além de hoje"), que vira "não há amanhã", expressão que perde metade do sentido e não podia ser mais incomodamente anasalada. (NS)


Avaliação:     





Peça: Rent
Direção geral no Brasil: Billy Bond
Direção musical: Oswaldo Sperandio
Quando: qui. e sex., às 21h; sáb., às 20h e 23h15; dom., às 18h e 21h
Onde: teatro Ópera (r. Rui Barbosa, 266, tel. 0/xx/11/3171-1277)
Quanto: R$ 25 a R$ 50





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