São Paulo, sexta, 19 de dezembro de 1997.




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MOSTRA ALEMANHA
País conta sua trágica história

MÁRCIA FORTES
especial para a Folha, em Berlim

A dramática história de um país politicamente dividido e psicologicamente torturado subiu as paredes do museu Martin-Gropius-Bau, em Berlim, na forma de 480 pinturas, esculturas e instalações incluídas na exibição "Deutschlandbilder" (Imagens da Alemanha), em cartaz até o final de janeiro de 1998.
Essa impressionante exibição oferece um panorama de mais de 60 anos de arte alemã, contando com a participação de 88 artistas -desde mestres modernistas, como Paul Klee, Max Ernst e Max Beckmann até importantes nomes contemporâneos, como Georg Baselitz, Anselm Kiefer, Gerhard Richter e Martin Kippenberger, passando ainda por revolucionários da linguagem artística, como Eva Hesse e Joseph Beuys.
Com obras de 1933 (ano em que o poder caiu nas mãos do partido Socialista Nacional de Hitler) até este ano, a mostra concentra seu foco nas posições de resistência e ruptura, exílio, agressão e repressão nos períodos da pré-Guerra, Pós-Guerra e Guerra Fria.
Ao contemplar pinturas como "Auto-Retrato com Identidade Judaica" (1943), de Felix Nussbaum, "Passagem" (1963), de A.R. Penck, e "Café Alemanha" (1978), de Jörg Immendorff, o espectador assimila as atmosferas político-sociais prevalecentes nessas décadas. As cores, texturas e formas das obras em exposição informam a construção mental das realidades na Alemanha.
Não se trata, no entanto, de uma exibição de "arte política", mas de obras que, em sua maioria, só poderiam ter sido criadas sob o estigma germânico.
A mostra começa com o bronze "Homem na Escuridão" (1934), que Max Beckmann esculpiu um ano depois de ser demitido como professor da Städlschule, de Frankfurt, e alguns anos antes de ser empurrado para o exílio juntamente com outros artistas incluídos na exibição "Arte Degenerada", organizada pelo governo nazista em 1937.
De Paul Klee, que se exilou na Suíça, a exibição inclui densas pinturas, como "Malhado da Lista" (1933) e "Marcado" (1935).
O espectro do exílio atingiu artistas de uma nova geração, como Eva Hesse, que, aos 3 anos, em 1939, emigrou com os pais judeus de Hamburgo para Nova York. Hesse morou na Alemanha em 1964-65, trabalhando em relevos como "Pernas de Uma Bola Caminhante", que marcaram a transição pictórica-escultural da sua influente obra. A mostra também inclui o seu dolorido "Auto-Retrato", pintado em 1961.
Artistas que cresceram sob o regime comunista no Pós-Guerra também ganham ênfase nesta mostra, que vem apresentar o desenvolvimento artístico dos dois Estados germânicos (Leste e Oeste) depois de mais de 40 anos de separação ideológica.
A mostra dá merecida relevância, por exemplo, às obras de A.R. Penck (proibido de expor na Alemanha Oriental em 1970 e expulso em 1980) e Werner Tübke, com uma série de pinturas realistas-fantásticas que ilustra os horrores do nazismo e que causou furor na Academia de Arte de Leipzig, em 1965.
De um ponto de vista crítico, o interessado espectador de "Deutschlandbilder" pode vir a sentir falta de um maior levantamento da forte pintura alemã dos anos 80, aqui representada apenas por poucos exemplares dos artistas mais reconhecidos.
A exibição, por maior amplitude que tenha, também dá pouco espaço para artistas que emergiram nesses anos 90. Para um olhar mais profundo na produção atual de jovens artistas alemães, o espectador tem que sair do museu e ganhar as ruas do bairro de Mitte de Berlim, onde novas galerias surgem a cada esquina e o cenário das artes plásticas está em ebulição.



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