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CINEMA
"As Loucuras de Dick e Jane", refilmagem de "Adivinhe Quem Vem para Roubar", atualiza crítica aos Estados Unidos
Dos dilemas de Jim Carrey nasce a graça
SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK
Se você não pode derrotar seus
inimigos, diz o clichê, una-se a
eles. Os de Jim Carrey são seu público, os críticos e ele próprio. Os
primeiros não dão bilheteria a
seus filmes sérios. Os segundos
não o elogiam em tais longas. E isso o impede de ganhar prêmios
como o Oscar, seu sonho.
E Jim Carrey retroalimenta a
máquina, fazendo comédias cada
vez mais engraçadas. É o caso de
"As Loucuras de Dick e Jane"
("Fun With Dick And Jane"), refilmagem da sátira política "Adivinhe Quem Vem para Roubar",
de 1977, com George Seagall e Jane Fonda, que estréia hoje.
Se o original criticava o Sonho
Americano ao mostrar um casal
que subitamente é excluído da
classe média e tem de recorrer a
assaltos para manter o estilo de vida, o de hoje atualiza a história para a crise da América Corporativa,
que começou na virada do século,
com a série de escândalos de
grandes empresas que abusavam
da chamada "contabilidade criativa", encabeçadas pela Enron.
Dick (Carrey) é um funcionário
de terceiro escalão transformado
à revelia em laranja do CEO inescrupuloso Jack (Alec Baldwin, excelente), que desaparece com a
bolada e deixa o pepino nas mãos
do ex-subordinado. Desempregado e sem dinheiro, ele convence a
mulher, Jane (Téa Leoni, hilariante), que o remédio é cair no crime.
Para falar sobre esse e outros assuntos, o comediante canadense
de 44 anos, o mais bem-pago de
Hollywood (US$ 25 milhões é seu
cachê mais alto), recebeu a Folha
em sua suíte no hotel Waldorf-Astoria, em Nova York, para uma
entrevista exclusiva.
Folha - Você acha que a corrupção
no mundo corporativo norte-americano terminou ou pelo menos diminuiu com a onda de denúncias e
algumas prisões dos últimos anos?
Jim Carrey - Não só não acho como tenho certeza de que não diminuiu. A diferença é que agora
nós estamos mais atentos e sabendo de mais casos. Mas, nesse momento, aqui nesse prédio, tem alguém fazendo "contabilidade
corporativa". É um mal que se
instalou no país e que a atual administração federal só estimula.
Folha - Seu filme é uma crítica
bem-humorada a tudo isso. Você
acha que o público médio vai perceber a mensagem ou estará distraído rindo de suas graças?
Carrey - Pode estar rindo de minhas graças, e é bom que ria, mas
a mensagem estará lá, em algum
lugar do cérebro do espectador.
Folha - Você desistiu dos filmes
sérios como "Majestic" (2001)?
Carrey - Na verdade, eles desistiram de mim. Digo isso porque recebo cada vez mais scripts muito
bons de filmes cômicos e cada vez
menos de dramas com a mesma
qualidade. Mas não desisti, não. E,
se você pensar bem, "O Show de
Truman" e "Brilho Eterno de uma
Mente sem Lembranças" unem
os dois, têm graça mas têm drama. E conteúdo. Eis um caminho.
Folha - Você poderia chamar um
diretor brasileiro. Eles são sérios...
Carrey - Conheço alguns. Mas
sou um ignorante do cinema que
é feito em seu país. De qualquer
maneira, quando eu era adolescente, tinha de fazer um trabalho
de fim de ano sobre alguma cidade do mundo. Escolhi o Rio de Janeiro. Montei um mapa da cidade
em que os principais monumentos saltam quando você abre. Ou
seja, quando eu for visitá-los, ao
menos não vou me perder [risos].
Folha - Voltando a "As Loucuras",
é um de seus filmes mais físicos,
lembra por exemplo o Fletcher
Reede de "O Mentiroso" (97).
Quanto do que aparece na tela estava no roteiro e quanto é você?
Carrey - A maior parte estava escrita, mas tenho muita liberdade
para improvisar. Gosto de testar
as cenas com a própria equipe. Se
eles estão rindo, é provável que a
platéia ria também.
Folha - Você fantasiado de Cher,
por exemplo, estava escrito?
Carrey - Na verdade, não. Exigi
em contrato porque tenho essa
fantasia secreta de me vestir de
mulher (risos). Falando sério, este
é um exemplo de como os filmes
que aceito fazer são maleáveis. O
roteiro previa que eu me vestisse
de Sonny [Bono, 1935-1998, ex-marido de Cher, com quem ela fazia dupla musical, e ex-congressista republicano] e que Téa Leoni
se vestisse de Cher, na fase anos 70
deles, num dos assaltos que nós
fazemos fantasiados. Eu só achei
que ficaria mais engraçado se invertêssemos as fantasias...
Folha - O que você vai fazer agora?
Carrey -Dar outra entrevista [risos]. Falando sério, ainda não sei.
O jornalista Sérgio Dávila teve parte de
suas despesas paga pela Sony
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