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O LIVRO
Biografia lançada no Brasil traz "lições de vida" do cantor
CARLOS ADRIANO
especial para a Folha
Há algumas semanas, a MSNBC,
canal de notícias da televisão norte-americana, noticiou a internação do cantor Frank Sinatra e junto ao seu nome legendou:
"1915-1998".
Essa crônica da morte antecipada fez com que o canal (uma associação da TV NBC e da Microsoft)
virasse fonte de piada e ira entre
fãs do octogenário cantor. A imagem durou um segundo, mas foi o
bastante para o estrago.
Pouco depois, Sinatra saía do
hospital e descansava em sua
mansão em Beverly Hills. Não foi
dessa vez que os "olhos azuis" se
fecharam para sempre. Ele vive
(pelo menos ainda, até o ponto final destas linhas).
É nessa curiosa circunstância
que chega ao Brasil o livro de Bill
Zehme, "Frank Sinatra - A Arte de
Viver". Por seus propósitos assumidos, funciona como abonador
almanaque moral do artista ("Fui
em busca de seu grande legado de
sabedoria mortal, pura e simplesmente", diz o autor).
Sinatra ambicionava transmitir
"para os mais jovens" o que
aprendera durante sua vida ("não
quero que isso morra comigo").
Zehme confessa sua pretensão
imodesta: "Quis fazer-lhe perguntas essenciais, do tipo capaz de salvar a vida de um sujeito. Busquei
aquilo que pudesse reunir as regras de vida de Frank".
Durante muitos meses, sentado
em seu avião, Sinatra gravou as
respostas. Para o autor, trata-se de
"uma biografia de sensibilidade e
um guia para os sonhadores de
grandes sonhos". Essa avaliação já
dimensiona seu juízo.
Traindo e reforçando o título
original ("The Way You Wear
Your Hat" -A Maneira como Você Usa Seu Chapéu), a versão brasileira apela para o realce do "savoir vivre" desse ícone do "american way of life".
Zehme, repórter da revista "Esquire", não esconde seu entusiasmo exagerado: "Sei que isso é
questionável, mas nenhum homem jamais viveu a vida com
maior amplitude, confiança ou estilo do que Frank Sinatra".
E continua: "Não poderia haver
figura mais complexa para um escritor tentar compreender plenamente. A vida que viveu é tão incontível quanto ele próprio. Poucos são os homens que merecem
tempo poético como ele".
Ou o horizonte do escritor é
meio estreito em referências histórico-culturais ou este é um caso
acintoso e consciente de pedagogia hagiográfica.
Os capítulos decupam a vida do
cantor em conselhos sobre "aventuras e lições", "bebida e fumo",
"amizade", "elegância", "namoros
e sobrevivência", "família e paternidade", "trabalhos e vitórias".
Arrumam os depoimentos por
suas preferências: bebidas, cigarros, smokings, chapéus, abotoaduras, lixas de unha e alicates de
cutícula, amigos, mulheres.
Vinhetas irrompem nos capítulos, trazendo "pérolas de seus pensamentos", como "viva cada dia
como se fosse o último" (resposta
à pergunta "qual é a única forma
de vencer a mortalidade?").
Ao cabo, é uma proposta tão interessante (colher depoimentos do
mito sobre temas prosaicos e cotidianos) quanto inconvincente (o
fascínio que o tema exerce sobre o
autor tem por princípio uma desmesurada idolatria).
O título em português indica o
espírito do livro. Realça o viver sobre a arte. Complementa, como
balanço-bula, a bibliografia geral
sobre o artista.
Talvez por isso mesmo não
conste nem discografia nem filmografia. Mas o livro é generoso
em iconografia, com muitas fotos
do renomado Phil Stern.
"My Way"
O destaque é a "moral" Sinatra,
captada no calor da confissão, discreta doutrina. O livro evita suas
ligações perigosas com a Máfia,
que lhe valeram papéis em filmes e
dívidas. As informações "factuais"
são parcas (sobram "impressões"), mas algumas valem.
Por exemplo, o cantor detesta
seu megahit "My Way" (gravado
em 1968), cuja letra Paul Anka escreveu "à imagem de Frank Sinatra", por ser, para ele, demasiado
condescendente e auto-elogiosa.
Segundo Zehme, "milionários e
operários ouviram a música cada
qual à sua maneira, como homenagem aos seus próprios sacrifícios em prol dos triunfos da vida".
Em 1994, enquanto cantava "My
Way", Sinatra desmaiou no palco.
O livro termina (antes das "palavras finais" do autor) com Frank
Sinatra e Dean Martin atirando a
esmo, em coelhos invisíveis num
deserto de Las Vegas. Quando
Dean atirou perto do rosto do
amigo, justificou: "Ora bolas,
Frank, eu não quero ver você entediado".
Como uma boa "self-made legend", Sinatra gosta de afirmar
que, dado à livre veneta, viveu a
vida a seu modo.
Livro: Frank Sinatra - A Arte de Viver
Autor: Bill Zehme
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