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CINEMA
Diretor fez 60 anos ontem e severas críticas ao projeto de Weffort
"O planeta vai rir", diz Cacá Diegues
DO ENVIADO A CANNES
O cineasta Carlos Diegues completou ontem 60 anos de vida e,
no segundo semestre, celebra 40
anos de cinema. Deve comemorar
filmando seu novo projeto, "Deus
É Brasileiro", adaptado de um
conto de João Ubaldo Ribeiro.
De presente, Diegues ganha um
site próprio na Internet
(www.carlosdiegues.com.br ou
www.cacadiegues.com.br). Muito
mais que um almanaque virtual
sobre seu cinema, a idéia é funcionar como um instrumento de intervenção nos grandes debates
culturais brasileiros.
Alagoano de nascimento, mas
carioca de adoção, Diegues foi cinemanovista ("Ganga Zumba"),
um dos mais bem-sucedidos diretores do fértil período Embrafilme ("Bye Bye Brasil") e um dos
poucos a driblar a crise pós-Collor ("Veja Esta Canção").
Para discutir o cinema hoje, e o
brasileiro em particular, a Folha
entrevistou Diegues por e-mail.
Leia abaixo uma síntese de suas
respostas, nas quais se opõe com
veemência ao projeto do Ministério da Cultura de abrir a chamada
Lei do Audiovisual para as TVs.
(AL)
Folha - Como você vê a Lei do Audiovisual para as TVs?
Carlos Diegues - Como um absurdo que precisa ser evitado. Será a morte súbita da produção independente no Brasil, do cinema
de autor que construímos neste
país durante quatro décadas. O
argumento de que a televisão é
empresarialmente mais competente do que o cinema é falso. Os
Barreto, os Massaini, os Pereira
dos Santos, os Khouri, os Farias,
só para citar alguns mais antigos,
estão por aí há 40 anos, fazendo
filmes sem parar, apesar de todas
as dificuldades que enfrentam. E
onde estão as TVs Tupi, Excelsior,
Rio, Gazeta, Continental, Manchete e tantas outras mais? Se essa
medida passar, será a primeira
vez, na história mundial do audiovisual, que o cinema financia a
televisão, e não vice-versa, como é
normal. O planeta vai rir de nós.
Folha - Sua obra completa apenas
40 anos e parece já sofrer problemas de conservação. Quais os casos
mais graves e como restaurá-los?
Diegues - Eu visitei recentemente a Cinemateca Brasileira de São
Paulo e fiquei emocionado com o
que vi, o sonho de Paulo Emilio
Salles Gomes se tornando realidade. O diabo é que a Cinemateca
não tem recursos para recuperar
os filmes que estão se deteriorando. No meu caso, estou com problemas nos negativos de "Bye Bye
Brasil", "Xica da Silva", "Quando
o Carnaval Chegar" e outros. E
olhe que eu sou um dos diretores
brasileiros que cuida melhor de
suas matrizes. Estou em busca de
empresas que queiram me ajudar,
por meio das leis de incentivo fiscal, a recuperar meus negativos.
Folha - O futuro do cinema passa
mesmo pela Internet?
Diegues - Sem dúvida. É claro
que as salas de exibição não vão
acabar nunca, o prazer de ver filmes fora de casa e ao lado de outras pessoas sempre vai existir.
Mas a Internet vai ser o feijão-com-arroz da difusão cinematográfica. Isso talvez ainda demore
uns cinco, seis anos para acontecer, mas vai acontecer. Já existem,
no mundo, cerca de 5.000 empresas adquirindo acervo e produzindo novos filmes para exploração na Internet. Quando a banda
larga se instalar, esse processo vai
ter uma partida muito rápida.
Folha - Você acredita na revolução digital das salas, no fim da distribuição e exibição em celulóide?
Diegues - Isso é inevitável, sobretudo porque é mais prático.
Essa digitalização geral é ainda
impraticável por ser muito caro o
processo de adaptação das salas.
Nos Estados Unidos, isto já está
sendo discutido entre as associações dos agentes econômicos do
mercado. Os exibidores querem
que os produtores e os distribuidores, teoricamente os mais beneficiados pela mudança, arquem
com essas despesas de adaptação.
Folha - Qual o objetivo do site?
Diegues - O meu site é apenas
um modesto espaço na rede para
informações sobre meus filmes.
Teremos atualidades, um link para o cinema brasileiro. Na primeira versão desta página, há um noticiário sobre o próximo Terceiro
Congresso do Cinema Brasileiro.
Folha - Qual debate este congresso deveria priorizar?
Diegues - O da distribuição em
geral e o da produção alternativa.
Os cineastas brasileiros estão descobrindo que o nó da economia
cinematográfica é a distribuição.
A produção não gera necessariamente distribuição, mas a distribuição gera produção sempre.
Por outro lado, é preciso que o Estado assuma de uma vez sua responsabilidade pelo que chamo de
produção alternativa. É normal
que diretores de marketing e outros executivos financeiros participem da seleção de títulos que
vão ser produzidos para o mercado, eles não são de inteligência inferior à dos executivos de Hollywood. Mas, em contrapartida, o
Estado tem de garantir financiamento direto para a produção de
filmes experimentais, de estreantes e filmes que não tenham passagem fácil no mercado. É um escândalo que um cineasta como
Nelson Pereira dos Santos não filme há sete anos.
Folha - Como anda a adaptação
do conto de João Ubaldo?
Diegues - Estou terminando de
escrever, com o João Emmanuel
Carneiro. "Deus É Brasileiro" é
uma comédia contemporânea baseada no conto de João Ubaldo
Ribeiro, "O Santo que Não Acreditava em Deus". Pretendo começar a filmá-lo ainda este ano.
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