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LIVROS
Crítica/"Eles Foram para Petrópolis"
Bastidores valorizam cartas de jornalistas
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Em abril de 2000, antes
da invenção do Twitter
e da popularização dos
diários virtuais que viriam a ser
conhecidos como blogs, os jornalistas brasileiros Ivan Lessa e
Mario Sergio Conti começaram
a trocar cartas virtuais em público, levadas ao ar pelo UOL. A
"Correspondência", título da
seção, durou quase um ano.
Os textos, mais os e-mails
particulares que trocaram no
período, viraram livro, "Eles
Foram para Petrópolis - Uma
Correspondência Virtual na Virada do Século". O texto público está em redondo, o privado,
em itálico, e foi respeitada a ordem cronológica.
Ivan Lessa, um dos grandes
escritores brasileiros, foi do
"Pasquim", colaborou para as
principais publicações brasileiras e escreve no serviço brasileiro da BBC em Londres, onde
mora há três décadas. Mario
Sergio Conti, um dos principais
jornalistas de sua geração, é autor de "Notícias do Planalto",
sobre a relação da imprensa
com o poder nos anos Collor, e
comanda a revista "Piauí".
Se o gênero epistolar é um
dos mais antigos da literatura,
dos gregos antigos às epístolas
de Paulo, no "Novo Testamento", tampouco é novidade a publicação de correspondência
entre personalidades que possa
ter algum valor literário. Vêm à
mente os escritos entre Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro e Mário de Andrade e
Carlos Drummond de Andrade,
para ficar em dois exemplos em
língua portuguesa.
As cartas trocadas em público por Lessa e Conti são um
prazer de leitura, o bom humor,
a insegurança calculada e as
brincadeiras com a linguagem
do primeiro, a erudição seca do
segundo, as cutucadelas de ambos em ambos e no mundo. Mas
a pegada do livro é outra: são os
bastidores, o "making of", digamos, da correspondência que ia
ao ar (pode ser acessada até hoje, de graça, em www1.uol.com.br/correspondencia).
É nos textos inéditos privados que se vê a construção do
que viraria público, as preocupações e bobagens cotidianas
que, conscientemente ou não,
acabariam nos escritos publicados, os recados velados, as
broncas em chefes. Um exemplo é o processo de doença e a
morte da mãe de Lessa, a cronista Elsie Lessa (1912-2000),
que ganha uma pungente homenagem de Conti, ao reescrever numa das "correspondências" uma crônica dela como se
fosse dele, mudando o gênero.
O melhor do livro está aí, nessa relação do crime perfeito
imaginado por Conti no começo (continuar fazendo o que os
dois fazem, que é trocar e-mails, e ainda receber por isso)
com a insistência da vida em
não seguir roteiros.
ELES FORAM PARA
PETRÓPOLIS
Autores: Mario Sergio Conti e Ivan
Lessa
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 45 (264 págs.)
Avaliação: bom
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