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LIVROS/LANÇAMENTOS
"A TAÇA DE OURO"
Em seu último romance, que sai agora em português, autor ousou na forma de contar suas histórias
Henry James mimetiza a percepção humana
MARCELO PEN
CRÍTICO DA FOLHA
Hoje em dia, é difícil crer que
Henry James (1843-1916) tenha sido um escritor popular. No
entanto, seu romance "The American" teve edição pirata nos EUA,
enquanto "Retrato de uma Senhora" virou um best-seller no final do século 19. Ao mesmo tempo, Daisy Miller, heroína de sua
novela homônima, tornou-se expressão da moda, designando
qualquer moça americana, voluntariosa e deslumbrada, em férias
na Europa.
A concepção de Henry James
como escritor difícil surgiu depois, com suas últimas histórias.
Os temas se mantiveram: a traição, o choque de culturas, a inter-relação entre arte e vida, mas o estilo se refinou. James havia superado o realismo que o consagrara
e se lançava em projetos cada vez
mais experimentais. Poucos, em
sua época, os entenderam.
É o caso deste "A Taça de Ouro", seu último romance completo. O germe da história é simples.
Surgiu ao autor doze anos antes
de escrevê-la. "Pai e filha, o marido de uma e a esposa do outro
enredados numa paixão mútua,
uma intriga", anotou James. Pensava em história curta para vender à revista "Harper". Havia um
senão: o elemento adulterino do
assunto. "Mas não seria simplesmente uma questão de como tratá-lo?", perguntou-se.
O tratamento do assunto é o que
fez a diferença. Em vez de narrativa curta, "entre 60 mil a 75 mil palavras", temos dos mais longos
romances do autor. Em vez de um
observador externo, James preferiu contar a história por meio de
dois pontos de vista principais.
A primeira parte do livro é narrada através dos olhos do príncipe
Amerigo, que se casa por interesse com a milionária Maggie Verver. Maggie e seu pai, Adam, têm
uma relação muito íntima. Para
que ele não se sinta só, Maggie
propõe que o pai se case com uma
amiga dela, Charlotte Stant. O que
a filha não sabe é que Charlotte
conhecia o príncipe. Eles tiveram
um caso, mas se separaram, pois
nenhum tinha dinheiro. A atração entre os dois ressurge, enquanto o elo entre Maggie e
Adam continua firme.
Antes das núpcias de Maggie,
Charlotte sugere ao príncipe um
presente de casamento: uma taça
de cristal revestida de ouro. Ele recusa o mimo por superstição. O
objeto apresenta uma rachadura
imperceptível. A taça de ouro tem
repercussão simbólica no romance. Seu magnífico exterior emblema a felicidade aparente do matrimônio entre o príncipe e Maggie, ao passo que a fratura denuncia a natureza frágil desse enlace.
Caberá a Maggie compreender
e reverter a situação. A segunda
parte da obra se fundamenta em
sua perspectiva. Há um componente novo no caráter da jovem.
Foi no terreno de seu comportamento íntimo com o pai (e distante em relação ao marido) que a
traição pôde engendrar-se. E, ao
contrário das outras heroínas de
James, Maggie mostrará que sabe
agir com astúcia.
James procurou levar adiante a
técnica dramática de narração. O
contador de histórias se afasta para dar lugar ao que se passa na
mente dos protagonistas. Somos
inteirados da situação por meio
daquilo que os personagens pensam, falam, por sua maneira de
agir. Esse método dramático pretendia mimetizar a percepção humana das coisas. Paradoxalmente, foi chamado de pomposo e artificial. Precisou que críticos como Ezra Pound e Percy Lubbock
defendessem o romancista, para
que ele fosse compreendido pelo
que tentava ser: um explorador de
sua arte.
A Taça de Ouro
The Golden Bowl
Autor: Henry James
Tradutor: Alves Calado
Editora: Record
Quanto: R$ 55 (592 págs.)
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