São Paulo, sexta-feira, 20 de outubro de 2000

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CRÍTICA
Momentos em trio dão frescor ao álbum

DA REPORTAGEM LOCAL

Como tem acontecido com a maioria dos filhos de artistas famosos (já é uma enxurrada, em 2000), o disco de Moreno Veloso -rebento de Caetano- exibe o confronto entre a instância forte da influência do pai e outra, mais tímida, da procura de caminhos próprios.
Dois dos muitos caetanos conhecidos se apresentam firmemente em "Máquina de Escrever Música". A influência mais visível é o Caetano de "Tropicália 2" (93) e subsequente. Não custa lembrar que Gilberto Gil tinha metade de "Tropicália 2", e ele é, mesmo, outra metade da tal influência forte.
Assim, por exemplo, a introdução de "Enquanto Isso" remete imediatamente à de "Haiti". A regravação de "Deusa do Amor" (92) se comunica com a de "Nossa Gente", do mesmo Olodum, por Caetano e Gil. Em espanhol, "Para Xó" simula a "Fina Estampa" (94) do pai. "Rio Longe" chama o samba-reggae jazzificado de "Livro" (97).
O outro Caetano muito presente em Moreno é o da fase pós-hippie, de samba-funk, dos tempos de "Odara" (77) e de "Tempo de Estio" (78). Essa é transparente, por exemplo, em "Arrivederci" (que inclui uma listagem de nomes próprios próximos, semelhante à que Caetano fazia em "Gente", de 77) e "Assim" (com excerto do samba-rock rural de Gil "Essa É pra Tocar no Rádio", de 75).
Bem, as comparações não trazem méritos ou deméritos a priori. Se por um lado a cançãozinha em espanhol e o samba-reggae soam algo anedóticos, por outro, a releitura de Olodum, impregnada de tristeza (e essa é uma marca forte no canto de Moreno), oferece um dos momentos mais intensos do disco.
Por outro lado, os momentos meio samba-funk, extraídos dos saberes paternos, são também os que trazem a instância contrária, que arriscam fazer Moreno soar novo de fato.
Tal acontece quando o disco é realmente feito por Moreno + 2 -pois, de resto, há muito gasto com a equação voz/violão dele, sozinho, lutando bravamente contra a imaturidade vocal ("Eu Sou Melhor Que Você", "Nenhuma", a "Esfinge" de Djavan), naquele pé de MPB que já não deu.
Mas, na companhia de Domenico e Kassin, Moreno produz delicadeza medrosa, sobre coleção minuciosa de instrumentos e aparelhagens nunca agressivos ou excessivos.
A impressão é de que asas mais soltas levariam o trio (e Moreno, à frente) a regiões mais altas da novidade musical.
Como um comentário, o clássico "Só Vendo Que Beleza" resgata o historicismo e o violão de Caetano. E é bacana. No dois mais dois, ser filho do pai não parece trazer a Moreno mais lucro ou mais prejuízo. No zero a zero, o jovem artista espera amadurecer. (PAS)

Máquina de Escrever Música   
Artista: Moreno + 2
Lançamento: Rock It!
Quanto: R$ 20, em média



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