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Crítica/"Alarm!"
Tom didático enfraquece romance histórico
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Um tema interessante e
original, além de um
apropriado conhecimento de história pelo escritor,
não bastam para produzir um
bom romance histórico. É o caso de "Alarm!", do veterano jornalista Roberto Muylaert, ex-presidente da Fundação Padre
Anchieta (TV Cultura), de 1986
a 1995, e ex-ministro-chefe da
Secretaria de Comunicação Social (governo FHC).
"Alarm!" era o grito de alerta
dos submarinistas alemães
quando precisavam submergir
rapidamente para fugir a um
ataque do inimigo. Muylaert
partiu de alguns fatos conhecidos para criar o personagem
principal, Werner Hoodart, um
brasileiro de Blumenau que,
pego pela guerra na terra dos
seus ancestrais, torna-se marinheiro de submarino alemão.
Casos reais
Houve vários casos reais de
brasileiros que lutaram pelo
Terceiro Reich; houve até o caso de um irmão que lutou no
Exército alemão na Rússia, enquanto outro lutava na Itália
com a Força Expedicionária
Brasileira (FEB).
Werner seria um bom personagem a ser aprofundado. Mas
o nada plausível enredo faz o
marinheiro desembarcar de
bote de borracha na Praia
Grande pois queria tomar uma
cachaça. O comandante do submarino U-199 não só emerge
em plena luz do dia na costa,
como permite a excursão...
Há vários pecados que o romancista histórico comete. O
mais comum é o didatismo. O
romance termina parecendo
uma colagem de verbetes de
enciclopédia. Romancistas históricos profissionais, como o
best-seller britânico Bernard
Cornwell, conseguem costurar
os fatos históricos -e mesmo
detalhes técnicos- na narrativa, de modo a não sobressaírem. Muylaert não tem esse
traquejo, como mostram os
"verbetes" sobre o gasogênio, a
FEB, o armamento do submarino etc. Até parte da bibliografia histórica é citada!
Algumas descrições são melhores, como o original e fétido
odor a bordo de um submarino.
Quando fala da velha São Paulo,
ele também mostra algo hoje
quase inimaginável -lotes vazios na rua Estados Unidos, de
onde se podia ver ao longe o
Hospital das Clínicas.
Liberdades
Misturar fato e ficção também pode ser um problema,
quando não há meios de o leitor
distinguir um do outro. Muylaert não toma liberdades com
a Copa de futebol de 1938; não
pegaria bem inventar um resultado de jogo. Mas ele o faz sem
problemas com a história do U-199, um submarino que de fato
existiu com este nome, e de fato
foi o único afundado pela Força
Aérea Brasileira durante a
guerra.
A descrição do afundamento
está repleta de erros (este resenhista descreveu em detalhe a
ação em reportagem na Folha
em 1993 e em artigo na revista
britânica de aviação "Air Enthusiast" em 1994). Por exemplo, ele narra o ataque feito por
um bombardeiro Hudson americano e um Catalina brasileiro
ao submarino; na verdade foram três aviões -um Mariner
americano, um Hudson brasileiro e por fim o Catalina brasileiro que terminou de afundar
o U-199.
Um pecado mais grave é a divulgação de mitos. Por exemplo, Muylaert diz que os soldados da FEB foram obrigados a
usar capacete de aço em combate pelos americanos. Nunca
houve tal coisa. Nenhum soldado seria louco de não usar capacete. O Exército os usava no
Brasil.
Código
Até uma velha piada foi descrita como podendo ter acontecido -que os brasileiros chegaram a usar o português como
"código secreto" em transmissões de rádio. "Até hoje ninguém sabe se esse episódio de
fato ocorreu", escreve o autor.
Levando-se em conta que português e italiano são bem semelhantes, e que os alemães transmitiam em português para tentar minar o moral brasileiro, fica bem clara a loucura de tal
afirmação.
ALARM!
Autor: Roberto Muylaert
Editora: Globo
Quanto: R$ 20 (232 págs.)
Avaliação: regular
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