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CINEMA/ESTRÉIA
"CHEGADAS E PARTIDAS"
Diretor fez "Regras da Vida" (99) e "Chocolate" (00)
Drama lacrimoso banaliza a tragédia com perfumaria
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
Depois do lançamento fracassado de "Chegadas e Partidas" nos Estados Unidos, no Natal do ano passado, o cineasta Lasse Hallström resolveu voltar para
a Suécia, seu país natal. Disse que
precisava reavaliar os rumos de
sua carreira, uma decisão para lá
de sábia, principalmente se considerados seus trabalhos mais recentes, produzidos pela Miramax.
O que aconteceu com Hallström é um símbolo da própria
trajetória da Miramax, produtora
que deixou de representar o cinema independente para se associar, principalmente, a dramas lacrimosos, feitos para agradar acadêmicos votantes no Oscar.
E os filmes de Hallström feitos
para ela ("Regras da Vida", de
1999, e "Chocolate", de 2000) são
os mais emblemáticos nesse sentido, atingindo o ápice da fórmula
em "Chegadas e Partidas".
Na Suécia, em 1986, Hallström
dirigiu o filme que carimbou seu
passaporte para o cinema americano, "Minha Vida de Cachorro".
É evidente, na sua fase americana, a tentativa de repetir o balanço
entre doçura e amargura que tornava "Minha Vida de Cachorro"
agradável sem perder o verniz europeu. Mas o que saiu dessa parceria com a Miramax foram filmes que invariavelmente banalizam a tragédia com perfumaria e
suavidade.
Uma suavidade que, por sinal,
se transforma em peso. "Chegadas e Partidas" é de tal forma engessado em um molde que se torna duramente arrastado, duro de
ser visto.
Kevin Spacey (em trabalho surpreendentemente burocrático)
vive Quoyle, um homem idiotizado que por força de circunstâncias improváveis retorna à sua cidade natal, na companhia de uma
tia interpretada pela grande Judy
Dench (elencos fortes fazem parte
da marca registrada Miramax).
Na horrenda e gelada Newfoundland, ele vai descobrir um passado que envolve incesto, abuso sexual e violência doméstica.
Mas Hallström trata tudo isso
com assustadora tranquilidade.
Ao mesmo tempo em que descobre seu passado, Quoyle se realiza
como redator de uma coluna no
jornal da pequena cidade. E isso,
por incrível que pareça, vai ter
muito mais peso para o personagem do que as atrocidades da sua
infância que vêm à tona.
No cinema, é fácil superar o sofrimento, principalmente se esse
sofrimento não tem um pingo sequer de autenticidade -tudo o
que falta a "Chegadas e Partidas".
Chegadas e Partidas
The Shipping News
Direção: Lasse Hallström
Produção: EUA, 2001
Com: Kevin Spacey, Julianne Moore, Judi
Dench e Cate Blanchett
Quando: a partir de hoje nos cines Belas
Artes, Internacional Guarulhos, Market
Place Cinemark, Pátio Higienópolis e
circuito
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