São Paulo, sexta-feira, 21 de janeiro de 2005

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"DESVENTURAS EM SÉRIE"

Fantasia promete mostrar vida árdua

BRUNO YUTAKA SAITO
DA REDAÇÃO

A busca por uma vida feliz é o único objetivo que une todos os seres humanos. Daí, levar esse desejo para as telas do cinema torna-se uma obsessão nem sempre bem-vinda. A arte nem sempre versa sobre coisas belas.
Portanto, não deixa de ser uma ousadia a proposta de "Desventuras em Série", adaptação para o cinema da bem-sucedida coleção de livros infantis. Desde o começo, o narrador (Jude Law) avisa que a história a ser contada está longe da alegria desesperada de fábulas com final feliz.
De início, três crianças, da família Baudelaire (associação com a idéia de tristeza), são avisadas que acabaram de se tornar órfãs, já que seus pais morreram em um incêndio misterioso. Ficarão sob a custódia de seu parente mais próximo, o malvado conde Olaf (Jim Carrey, histérico como sempre, interpretando o mesmo personagem de sempre-ele mesmo), que irá usar todos os artifícios para atormentar -e matar- as crianças. Para ele, só interessa a fortuna que os heróis irão herdar.
Ou seja, imagina-se -e isso é anunciado a todo momento- que os mocinhos se darão mal, e que o vilão triunfará. A dúvida maior é outra. Será que um "blockbuster" conseguirá subverter lógicas tão arraigadas da indústria cultural e manter uma proposta que só deixaria crianças e pais desgostosos ao final da sessão, além de bilheterias vazias?
À parte a provocação, "Desventuras" pisa em terreno ambíguo ao se mostrar uma versão alternativa de "Harry Potter". O terreno da ilusão será a trilha percorrida. Mas, ao contrário do bruxo, os Baudelaire não têm poderes mágicos -inteligência e destreza serão armas-, e seu universo é o mundo "de verdade", mesmo que distorcido por cenários góticos de uma época indefinida.
O que acaba constituindo o maior problema do filme. Se a idéia é mostrar às crianças que o mundo está longe de um mar de rosas, tudo vem como uma improvável fantasia, irreal, como a presença de Carrey já anuncia. Os órfãos carregam um semblante triste, mas o que se vê são crianças conquistando um sonho inconsciente -a liberdade da vida regrada dos pais-, ao mesmo tempo em que se divertem num parque de diversões de perigos incessantes. Ao final, "Desventuras" assemelha-se mais a linhas de alimentos diet/light que servem mais para aliviar uma consciência pesada de quem come demais do que para reais benefícios. Desventuras em Série
Lemony Snicket's a Series of Unfortunate Events
  
Direção: Brad Silberling
Produção: EUA, 2004
Com: Jim Carrey, Kara Hoffman
Quando: a partir de hoje nos cines Anália Franco, Jardim Sul e circuito

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