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`Caindo no Ridículo' satiriza hipocrisia social
JOSÉ GERALDO COUTO
especial para a Folha
``Caindo no Ridículo'', grande
produção francesa indicada ao Oscar de filme estrangeiro, é um misto de drama e comédia ambientado em Versalhes em 1780, um lugar mais ou menos como Brasília
hoje: centenas de parasitas esvoaçando em torno do rei e engalfinhando-se por uma migalha de
seus favores.
No ocaso do Antigo Regime, nobres dos mais variados escalões
encenavam na corte de Luís 16 um
jogo de aparências, onde a maior
desgraça possível era cair no ridículo, e a arma contra este era a presença de espírito.
Para não perder o requebrado,
era necessário ter na ponta da língua uma piada, um jogo de palavras, um ``mot désprit'' que desconcertasse o interlocutor e tornasse cúmplice o ouvinte.
Nesse ninho de cobras vai parar
Gregoire Ponceludon (Charles
Berling), um jovem nobre de província, de família decaída, com um
objetivo igualmente nobre: conseguir o apoio do rei para a drenagem dos pântanos de sua região,
cujas águas insalubres têm dizimado famílias camponesas.
Ponceludon é o oposto do ambiente obscurantista e decadente
da corte: homem das Luzes, é engenheiro e admirador de Voltaire.
Esse conflito entre o personagem
e o meio poderia ter gerado um
grande drama ou uma grande comédia, mas não é o que acontece.
A despeito da aparência de crítica ao ambiente malsão da corte, o
filme de Patrice Leconte (diretor
de ``O Marido da Cabeleireira'') de
certo modo sucumbe ao fascínio
diante daquela frescura toda.
À falta de uma linha dramática
definida, esboça (e deixa a meio
caminho) uma porção de subtemas interessantes: a hipocrisia social como método, o confronto
entre razão e convenção, as diferenças entre o ``humour'' inglês e
o ``sprit'' francês, a incipiente liberação da mulher setecentista via
conhecimento científico etc.
Nessa rede de fios, Leconte acabou optando pelo mais seguro e
convencional como condutor de
seu filme: o dilema do protagonista entre o amor de duas mulheres.
Uma delas (Judith Godreche) é
quase uma alma gêmea sua: moça
instruída, liberada e idealista, quer
usar a ciência para melhorar o
mundo. A outra (Fanny Ardant) é
todo o oposto: condessa lasciva e
corrompida, usa sua influência
junto ao rei para seduzir os homens que lhe interessam.
Todo o conflito do filme se reduz
a essa opção. Se Ponceludon for
fiel a seu verdadeiro amor, perderá
a chance de pedir ao rei que ajude
seus camponeses. O amor ou a
missão? Oh, dúvida cruel.
O clichê romântico se agrava
aqui com um erro primário de
``casting''. Fazer amor com a condessa é apresentado no filme como
um sacrifício por uma boa causa.
E, convenhamos, ir para a cama
com Fanny Ardant não chega a ser
nenhum sacrifício.
De todo modo, os franceses gostaram de mais esse exemplo de seu
``cinema de qualidade'': o filme foi
o grande vencedor do César e estourou na bilheteria.
Filme: Caindo no Ridículo (Ridicule)
Produção: França, 1996
Direção: Patrice Leconte
Elenco: Fanny Ardant, Charles Berling,
Onde: Belas Artes (sala Carmen Miranda)
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