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RESENHA
A redenção pelo jornalismo "público"
MARIO VITOR SANTOS
da Reportagem Local
Em janeiro
passado, o papa
visitava Cuba
pela primeira
vez. A imprensa
norte-americana montava
acampamento em Havana. As notícias do suposto caso sexual entre
Monica Lewinsky e o presidente
Bill Clinton foram o sinal para que
os âncoras das grandes redes de
TV desmontassem as barracas e
decolassem para Washington, trazendo um rastro de repórteres dos
grandes jornais e revistas.
Quais os critérios que orientaram a decisão sobre que notícia
era a mais relevante para o público? Qual a repercussão que esse tipo de decisão tem sobre a credibilidade dos veículos?
"Detonando a Notícia: Como a
Mídia Corrói a Democracia Americana", do jornalista James Fallows, foi lançado nos EUA em 96,
e, portanto, não aborda diretamente a disputa de "appeal" entre
as duplas Clinton-Lewinsky e papa-Fidel. Examina decisões semelhantes e suas repercussões para a
imagem da "indústria", como se
diz nos EUA.
De acordo com Fallows, colunista da revista "The Atlantic
Monthly", o jornalismo está atacado pelo negativismo e a sede de
escândalo. Encontra-se sob a ação
de um grupo de estrelas que,
quanto mais importantes, mais
são forçadas a abrir mão da "essência do verdadeiro jornalismo".
Sua atividade pode corroer a
saúde do sistema político, que se
vê obrigado a agir segundo critérios impostos pelos meios de comunicação, cuja ação, cada vez
mais alheia aos interesses reais do
público, molda a agenda governamental.
Segundo Fallows, o negativismo
da imprensa desgasta o interesse
pela cidadania e, em última instância, prejudica o próprio jornalismo: "Quanto menos se interessarem pela vida pública da nação,
menos os americanos se interessarão por qualquer forma de jornalismo", diz ele.
Um exemplo dessa atitude seriam as coberturas eleitorais. Fallows identifica uma tendência a se
priorizar o sobe-desce das campanhas, as estratégias dos assessores
de marketing, em detrimento do
debate de temas relevantes.
Assim, toda questão pública,
qualquer decisão tomada ou posição assumida é analisada prioritariamente sob o efeito que poderá
ter sobre o perde-ganha do jogo
político. O autor mostra-se nostálgico quanto a um modelo de jornalista, idealista e ligado à comunidade, em oposição ao de hoje,
em que o sucesso jornalístico se
confundiria com fama e fortuna.
Nessa situação, advogar os interesses da elite é tão fácil que dificilmente parece predisposição.
O livro parte de um diagnóstico
crítico para defender uma proposta moralizadora, que tem cada vez
mais adeptos. A saída para a degradação dos padrões jornalísticos
estaria no jornalismo "público",
destinado a estar "junto da comunidade": em que os repórteres deveriam tomar partido e encorajar
a participação política para a solução de seus problemas.
Tal jornalismo teria um viés menos pessimista, em que as distinções entre governo e cidadania
tenderiam a ser menos marcadas.
Esse jornalismo assumiria, afinal,
que neutralidade não existe. Sob a
bandeira do engajamento construtivo, estaria aberta a via para a
sorridente adesão ao status quo.
Lançado agora pela Civilização
Brasileira, o livro tem falhas de
conteúdo, tradução e português.
Informa-se que o Brasil tem uma
população vinte vezes (e não quatro) maior do que a Argentina. A
palavra "downtown" é traduzida
como "cidade baixa". O verbo tachar, de pôr defeito, vem como
"taxar" (aplicar taxa). Em lugar de
estar em xeque na questão vietnamita, o tradutor escreve que Clinton está "em cheque" -que, além
de errado, poderia ser uma ofensa.
Livro: Detonando a Notícia: Como a Mídia
Corrói a Democracia Americana
Autor: James Fallows
Lançamento: Civilização Brasileira
Preço: R$ 35 (352
págs)
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