São Paulo, sábado, 21 de março de 1998

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Pia Fraus cria mundo em "Éonoé"

ERIKA SALLUM
enviada especial a Curitiba

Cosmogonia: narrativa que trata da origem e evolução do universo. Com muita terra, ferro e acrobacias, a companhia Pia Fraus Teatro mostra hoje e amanhã no Festival de Curitiba sua visão do princípio do mundo.
E, para o grupo paulistano, tudo começa com "Éonoé, uma Cosmogonia", nome do espetáculo derivado do texto homônimo de José Rubens Siqueira, autor, diretor, tradutor e homem de teatro com mais de 30 anos de carreira.
A peça -que marca a estréia do Pia Fraus em montagens de rua para adultos- será exibida nesta noite, às 21h30, na Rua - Boca Maldita, e amanhã, às 20h, no mesmo local.
"Éonoé, uma Cosmogonia" nasceu da vontade da companhia de criar um espetáculo ao ar livre, para todas as idades, que prosseguisse com sua linha de trabalho: a mistura de linguagens.
Com esse desejo na cabeça, o grupo, formado em 1984 por Beto Andretta e Beto Lima e, logo depois, por Domingos Montagner, procurou Siqueira, a quem encomendou o texto.
Na época, o tema ainda não se encontrava totalmente definido. "Estávamos envolvidos com uma peça para crianças, que gostam muito de bichos. Em nossas conversas com Siqueira, apareceu o tema da Arca de Noé", contou à Folha Montagner.
"Ele demorou um ano para produzir o texto e, quando nos entregou, era uma coisa alucinada, muito diferente do que tínhamos combinado", acrescenta Andretta.
O resultado final, "Éonoé", pode ser definido como a visão pessoal de Siqueira sobre o início do universo, algo que mistura cosmogonias de várias culturas. No meio disso, aparece a saga de Noé, sua e embarcação e seus animais.
Para colocar essa idéia no palco, o Pia Fraus contou com a ajuda do diretor Francisco Medeiros (de "A Gaivota", "Sherazade" etc.): "Nosso maior desafio foi descobrir de que forma esse poema pode se integrar à peça. Não é um diálogo, mas sim uma obra narrativa, como um índio contando uma lenda a seu povo".
Sem dispor de uma historinha linear, com começo, meio e fim definidos, o Pia Fraus trouxe para a cena duas toneladas de terra, duas traves de trapézio de 5,5 metros de altura, uma rede e objetos de ferro, barro e palha. Até um latão, que estava enterrado no jardim da casa de Montagner, está lá.
Desta vez o Pia Fraus não trabalhará com bonecos, consagrados em montagens anteriores, como "Flor de Obsessão", também dirigida por Medeiros e que chegou a se apresentar no festival de Edimburgo.
Foi nesse evento, aliás, que o grupo se deparou com a denominação que mais se aproxima de suas características: teatro físico-visual. "Não é um rótulo, mas uma maneira de as pessoas nos reconhecerem", disse Andretta.
A encenação
A terra não aparece neste novo projeto do Pia Fraus por acaso. Há cerca de dois anos, a companhia, "urbanóide de formação", começou a se incomodar com o caos da cidade grande.
Montagner deu o pontapé inicial e se mudou para um bairro afastado do centro e cercado de mato. Os outros atores aderiram à idéia.
"No início, imaginávamos que "Éonoé' seria construído com pneus, barulho etc. Essa mudança de ares nos inspirou muito, e trouxemos a natureza para o centro de nossa criação", afirmou Andretta.
Com 14 anos de estrada, o Pia Fraus (que, em latim, quer dizer "mentira contada com boas intenções") ainda presenteia o público com uma trilha sonora que une o tecno do Prodigy e Chemical Brothers a Raul Seixas.
Depois de Curitiba, o grupo segue para o Festival de Teatro de Bogotá.



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