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CRÍTICA/"ESTRELA SOLITÁRIA"
Novo longa de Wenders fica a um deserto de distância de "Paris, Texas"
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
Em "Estrela Solitária", Wim
Wenders retoma o universo
de "Paris, Texas", que há 22 anos
lhe deu a Palma de Ouro no Festival de Cannes e firmou seu reconhecimento no time dos "grandes
diretores". Temos, de novo, a seca
paisagem do interior americano,
palco dos mitológicos faroestes,
como cenário para a história de
um homem em crise tentando
acertar os ponteiros com o passado. Temos, ainda, o texto de Sam
Shepard, dramaturgo que escreveu "Paris, Texas" e só não interpretou o personagem principal
porque não quis, apesar da insistência do diretor.
Shepard, aqui, concordou em
emprestar seu rosto à própria
criatura, Howard Spencer, lendário ator-caubói, freqüentador do
noticiário sensacionalista graças a
seu comportamento escandaloso.
Spencer abandona o set de seu
mais recente faroeste e parte em
uma jornada que vai levá-lo à porta de sua mãe (Eva Marie-Saint,
em participação especialíssima) e,
depois, à porta do filho que nunca
conheceu (Gabriel Mann), fruto
de um breve relacionamento com
uma garçonete (Jessica Lange).
Ao mesmo tempo, cruza seu caminho uma jovem misteriosa (Sarah Polley), também sua filha.
É radical, porém, a diferença entre "Paris, Texas" e "Estrela Solitária" -um abismo que se nota tanto nos elementos narrativos como
no tratamento dado à imagem. Os
dois filmes abrem com um exuberante plano-seqüência no deserto
americano. Mas, agora, a exuberância reproduz o que seria o início épico de um faroeste, filme-dentro-do-filme. Salta aos olhos o
anacronismo: os faroestes já não
são assim exuberantes, mas crepusculares, e seus heróis estão
longe de carregar a mesma firmeza. O inegável talento de Wenders
para enquadrar e movimentar a
câmera parece agora um tanto engessado, preso ao que seria um
suposto "estilo Wim Wenders".
O próprio Howard Spencer é
um personagem frágil em sua
existência, sem concretude (não é
Clint Eastwood, certamente) e
que tampouco se desenha como
uma figura imaginária interessante. No fim das contas, trata-se não
só de um homem em crise existencial, mas, sobretudo, do personagem-sintoma de um filme em
crise, que não sabe exatamente o
que quer dizer.
A angústia seca de "Paris, Texas" se dilui em um drama convencional de um ajuste de contas
com o passado e de amores desperdiçados entre Spencer e a garçonete, Spencer e seus filhos, e entre os irmãos tardios, filhos do
mesmo pai que nunca se conheceram, agora solidários na superação de ressentimentos. O contraste maior, talvez, se faça ver entre a fotografia arriscada de
Robby Muller em "Paris, Texas" e
a imagem definida e confiante em
si mesma de Franz Lustig. Um deserto de distância.
Estrela Solitária
Don't Come Knocking
Direção: Wim Wenders
Produção: EUA/Alemanha, 2005
Quando: a partir de hoje no Espaço Unibanco, Sala UOL e circuito
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