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"O CEMITÉRIO DOS VIVOS"/ROMANCE; "UM PASSEIO..."/CRÔNICAS
Reedição de obra de Lima tropeça
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
A reedição pela Planeta (em
parceria com a Biblioteca
Nacional) de dois importantes títulos que estavam fora de catálogo deve ser, naturalmente, comemorada. Mas merecia mais "O
Cemitério dos Vivos", de Lima
Barreto, que sai ao mesmo tempo
que "Um Passeio pela Cidade do
Rio de Janeiro", de Joaquim Manuel de Macedo.
Tentativa de Lima (1881-1922)
de transformar em ficção sua segunda e última passagem pelo
hospício da Praia Vermelha, no
Rio, entre 25 de dezembro de 1919
e 2 de fevereiro de 1920, "O Cemitério dos Vivos" é ele e suas circunstâncias.
É praticamente impossível medir a importância desse romance
inacabado e do "Diário do Hospício", que se edita sempre com ele,
sem informações sobre a feitura
deles e sobre a vida de Lima. Mas
essas informações rareiam na nova edição.
Para começar, não há qualquer
menção a Francisco de Assis Barbosa. Além de ser biógrafo do escritor, foi Barbosa quem descobriu todos os seus manuscritos na
casa onde Lima viveu com a irmã.
Foi ele quem cuidou da primeira
edição de "O Cemitério dos Vivos", em 1953.
O organizador Diogo de Hollanda indica que preferiu ignorar
o trabalho de Barbosa e ir aos manuscritos, que estão na Biblioteca
Nacional. Uma opção hercúlea,
porque a letra de Lima é de difícil
leitura. E uma opção que cria
constrangimentos e omissões.
Hollanda, por exemplo, relativiza um dos trechos mais famosos
do "Diário", quando Lima descreve o que vê a partir do hospício:
"...o ar azul dessa linda enseada de
Botafogo que nos consola na sua
imarcescível beleza...". Diante de
um trecho tão belo, o organizador, significativamente, lembra
que a palavra "beleza" não está no
manuscrito e foi posta por dedução. Uma já consagrada dedução.
A edição também não informa
que as folhas em que Lima escrevia eram fornecidas pelo diretor
do hospício. Esse é um fator fundamental para se ler "Diário" e "O
Cemitério". Durante a maior parte das cinco semanas de internação, Lima esteve lúcido, o que dá
aos textos um alto valor de documento histórico: um grande escritor conta por dentro o que é um
hospício.
Os delírios de Lima eram derivados do tratamento à base de
ópio. Mas não se fala de ópio na
edição. Lima questionava se havia
algo de hereditário na sua suposta
loucura -ou no seu alcoolismo,
mal que o levou ao hospício e o
destruiu. Mas não há, na edição,
referência à loucura do pai, informação fundamental.
Vale ressalvar que, apesar dos
tropeços, é sempre impressionante ler esses escritos de Lima, em
que ele se projeta num narrador
que sonha ser escritor, mas se
afunda na miséria e no alcoolismo. "Sonhei Spinoza, mas não tive força para realizar a vida dele;
sonhei Dostoiévski, mas me faltou a sua névoa", escreve ele,
emocionante.
Hollanda encontrou mais facilidade para organizar os relatos do
autor de "A Moreninha", já que
eles foram publicadas em livro
pelo próprio Macedo em 1862 (o
primeiro volume, que está saindo
agora) e 1863 (o segundo, que a
Planeta ainda lançará). Sem consultas a manuscritos e respeitando-se a ordem cronológica em
que os textos foram publicados
no "Jornal do Commercio", a nova edição não erra.
O Cemitério dos Vivos
Autor: Lima Barreto
Editora: Planeta
Quanto: R$ 39 (240 págs.)
Um Passeio pela Cidade do Rio
de Janeiro
Autor: Joaquim Manuel de Macedo
Editora: Planeta
Quanto: R$ 43 (334 págs.)
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