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ARTIGO
Depois do Salão do Livro e às vésperas da Copa
BETTY MILAN
especial para a Folha
A Copa está no ar e o Brasil já
entrou em cena de modo espetacular por meio de três imagens.
A capa do "Figaro Magazine",
em que Ronaldo, diante de uma
bola de pedra, posa para a eternidade. Uma posição que tanto evoca o pensador de Rodin quanto o
discóbolo de Miron, evidenciando
que entre o espírito e o corpo não
há contradição.
Assim fotografado, Ronaldo
simboliza um futebol para o qual o
impossível não existe, o de um
Leônidas, de um Garrincha ou de
um Pelé -o futebol brasileiro.
Quem abre depois a revista lê que,
aos 21 anos, Ronaldo já fez esquecer Pelé. Se o leitor for brasileiro,
se dirá que pertence, como os gregos, a um país de heróis.
A segunda imagem impressionante é a da foto da página inteira
do "Le Monde" sobre o show de
Gilberto Gil no Olympia. Trata-se
de um atabaque que duas mãos estão prestes a tocar. Duas mãos cuja
particularidade é a de serem negras e estarem à mercê da música.
No "Le Monde", lê-se que, para
Naná Vasconcelos, bater num
tambor é um gesto de engajamento. E o coração então bate porque é
a cultura engajada do Brasil que
vai desembarcar.
A terceira imagem se espalha pela cidade inteira. É a dos cartazes
com uma foto de Gilberto Gil, que
imediatamente comove, pois vemos que já é grisalha a sua carapinha, e o sorriso é de mãe-de-santo,
tão sereno quanto generoso.
Nesses cartazes, que divulgam o
show do Olympia, o que mais impressiona, no entanto, é o que está
escrito em baixo do nome do compositor: "Ao vivo na Copa de 98".
Porque, pela primeira vez, em 20
anos, o texto está em português.
A gente lê, relê e se diz que o português chegou a Paris graças aos
músicos brasileiros. Lembra-se de
uma das muitas verdades de
"Verdade Tropical": a música é a
mais eficiente arma de afirmação
da língua portuguesa no mundo.
Depois, reconsidera a frase de
Caetano à luz da história dos últimos 20 anos e se diz que a língua
também chegou por causa dos jogadores de futebol e do autor estrangeiro mais lido na França:
Paulo Coelho, cuja identificação
com a nossa cultura popular ninguém ignora.
Só resta concluir que, se a nossa
literatura um dia efetivamente se
impuser aqui, será porque tivemos um Pelé, um Gilberto Gil e
um Paulo Coelho. Porque o Braaasilll! foi a nossa locomotiva, a bola
não parou de rolar nem o samba
de tocar, porque houve um escritor brasileiro que entendeu o processo de globalização.
Talvez não seja errado dizer que
o Brasil literário vai se impor na
França por meio de uma estratégia
que os militares chamam de "indireta" - mas involuntária.
Quem fala grosso e abre caminho é o Braaasilll!
Betty Milan é escritora, autora de "O Papagaio
e o Doutor" (Record)
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