|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Tudo sobre Pedro e Pina
O espanhol Pedro Almodóvar inicia as filmagens de "Hable con Ella", registrando cenas de "Masurca Fogo", da coreógrafa alemã Pina Bausch, em Paris
FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL A PARIS
"Sem sussurros, sem sexo": é assim que o diretor Pedro Almodóvar ("Tudo sobre Minha Mãe") dá
o comando para a filmagem de
uma das cenas de sua nova produção "Hable con Ella" ("Fale
com Ela"). A Folha acompanhou
a bem humorada gravação de cenas de seu 14º filme de longa-metragem no Théâtre de la Ville, em
Paris, no último dia 11.
Almodóvar filmou lá cenas de
"Masurca Fogo", da coreógrafa
alemã Pina Bausch. Antes, já havia registrado cenas dessa peça
em Palermo, na Itália, e de "Café
Müller", em Wuppertal, a cidade
sede da companhia de Bausch .
"Estou seguindo Pina feito um
cão", disse o diretor espanhol.
"Suas peças parecem feitas de encomenda para o roteiro de meu
filme", conta.
É a segunda vez que Bausch seduz um diretor de cinema. A primeira vez foi com Federico Fellini
em "La Nave Va" (1983). A coreógrafa ganhou o papel de uma
princesa cega, imediatamente
após o diretor italiano ter assistido a "Café Müller", em Roma. A
alemã dança na peça, que continua no repertório da companhia,
com os olhos fechados.
Agora, com Almodóvar, a peça
entra para a história da cinematografia. É durante uma apresentação de "Café Müller" que os protagonistas do filme, uma delas
uma bailarina, se reencontram e
iniciam uma história de amor.
"Hable con Ella" conta a trama
de um quarteto. A atriz Leonor
Watling é uma bailarina com dificuldades de se relacionar com as
pessoas. Rosário Flores interpreta
uma toureira que sofre de solidão.
Javier Câmara é um enfermeiro e
o argentino Darío Grandinetti interpreta um jornalista. O filme
tem ainda as participações especiais de Marisa Paredes e Geraldine Chaplin. Os atores não participaram das filmagens em Paris.
Trechos de obras de Bausch
abrem e encerram a nova produção de Almodóvar. "Masurca Fogo", a romântica produção vista
em São Paulo, em dezembro passado, é o final feliz do filme.
O diretor espanhol selecionou
duas cenas, nas quais as brasileiras Ruth Amarante e Regina Advento são figuras centrais. Não foi
por acaso. Quando esteve em Palermo, Almodóvar já havia registrado cenas de "Masurca", mas
não gostou da bailarina argentina
que substituía Amarante, na época grávida. "Ela não sabia suspirar
como Ruth", disse Almodóvar.
Por isso, voltou a registrar imagens da peça com a brasileira.
Quem assistiu à "Masurca" no
Brasil vai estranhar o cenário do
filme. É que Bausch estava em
cartaz com sua co-produção de
2000 sobre a Hungria, "Wieseland", que tem uma imensa plataforma de grama e samambaias
com água corrente como cenário.
"Sorriam, pensem no que vocês
podem fazer com essas lindas
mulheres", pedia Almodóvar aos
bailarinos, enquanto Bausch observava a orientação à distância.
Foram três dias de trabalho. Já
de volta à Espanha, Almodóvar
começa nos próximos dias o período de nove semanas de filmagem com os atores. A previsão é
que em março de 2002 ele seja
lançado.
Woody Allen
Durante a estada em Paris,
Bausch e Almodóvar formaram
uma dupla que circulou de braços
dados pela cidade. Entre os compromissos, um jantar na casa de
Luziah e Gil Hennessy, sócios da
poderosa rede LVMH.
A ceia estava mais para uma daqueles festas de "high society" dos
filmes de Woody Allen do que para o universo kitsch almodovariano. Num apartamento luxuoso,
com vista para o rio Sena, a dupla
conversou muito sobre o Brasil,
aproveitando a presença do produtor Emilio Kalil, que organizou
a co-produção brasileira da nova
peça de Bausch.
Enquanto isso, empregados circulavam e até intervinham nas
conversas. Uma delas havia ajudado Ernesto Neto a costurar
uma de suas instalações na Bienal
de Veneza.
Bausch queria sugestões de nome para a peça sobre o Brasil, que
estréia em agosto, em São Paulo.
"Por que não Bunda-Bausch?",
sugeriu Almodóvar. "Tudo lá gira
mesmo em torno de sexo, não é?",
comentava gargalhando. A coreógrafa não gostou da idéia, prefere
algo que tenha a ver com cachaça.
Consenso eles têm quando falam de MPB. São fãs declarados e
acham que a música é um tema
que os une. "Nós nos parecemos
muito, temos o mesmo gosto
eclético por música e a utilizamos
da mesma forma livre em nossas
criações", diz Almodóvar.
O diretor anda enamorado pela
voz de Bebel Gilberto. "Ela se parece com a Betty Midler", brinca.
A coincidência: é com uma interpretação de Bebel que Bausch
abre sua peça à brasileira, a canção "Samba da Benção", de Vinicius de Moraes e Baden Powell.
Caetano Veloso é outro amigo
em comum. Ele viaja à Madri em
julho para participar também do
filme de Almodóvar. Irá cantar no
set "Cucurrucucú".
Em outubro, os três, Bausch, Almodóvar e Caetano, estarão juntos em Wuppertal, no festival que
a coreógrafa prepara. O brasileiro
cantando e o espanhol organizando uma noite espanhola.
Ainda em seu novo filme, o diretor irá incluir duas canções de
Tom Jobim: "Por Toda Minha Vida", com Elis Regina, e "Once I
Loved", com Shirley Horn. "Se
fosse um musical, ele seria o compositor ideal", disse Almodóvar.
Quando participou de "E la Nave Vá", Bausch empolgou-se tanto com cinema, que fez alguns
anos depois o filme "O Lamento
da Imperatriz".
Agora, questionada se irá se
motivar novamente, ela apenas
sorri e olha para seu produtor,
Matthias Schmiegelt, que responde por ela: "Impossível, sua agenda já está cheia até 2004, inclusive
as próximas criações. Em 2002 será sobre Wuppertal, em 2003 sobre a Turquia e em 2004 sobre o
Japão". Resta à coreógrafa ver
suas obras nas telas em "Hable
con Ella".
Texto Anterior: Primavera-verão: Jovens abrem temporada 2002 Próximo Texto: Música/Lançamento: A contraventora do hip hop Índice
|