São Paulo, sábado, 22 de junho de 2002

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LIVROS/LANÇAMENTOS

"BAO CHI, BAO CHI - UM ROMANCE DA GUERRA DO VIETNAM"

Livro romanceia fatos reais ocorridos a jornalistas

Em narrativa, realidade supera ficção

France Presse
Tanques lança-chamas queimam um vilarejo próximo a Binh Son, na Província de Quang Ngai, em ação da operação Doser, durante a Guerra do Vietnã


RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

Morreram 45 jornalistas cobrindo a longa Guerra do Vietnã; 18 foram dados como desaparecidos (ou seja, morreram também). Quatro deles foram mortos em maio de 1968 quando o jipe em que andavam por Saigon (hoje Ho Chi Minh) foi metralhado por guerrilheiros vietcongues. Um outro escapou para contar a história. As vítimas gritavam "bao chi, bao chi" -"imprensa", "jornalista"-, mas mesmo assim foram mortos. Apenas um general americano morreu nessa guerra. Foi acidente.
Nessa mesma época, o jornalista brasileiro Luís Edgar de Andrade estava no Vietnã. O incidente faz parte desse seu romance sobre a guerra com fortes traços autobiográficos. Assim como Andrade, o personagem principal, Miguel Arruda, chegou ao então Vietnã do Sul no final da ofensiva do Tet, um arriscado lance da guerrilha comunista e dos seus aliados do Vietnã do Norte que levou os combates do campo para o coração das cidades.
Andrade e o alter ego Arruda também passaram por um dos locais mais perigosos e de maior simbolismo da guerra: a base americana em Khe Sanh, próxima da fronteira entre os dois Vietnãs.
Cerca de 6.000 fuzileiros navais ("marines") americanos estiveram durante mais de três meses cercados por uma força comunista várias vezes maior. Havia o risco de acontecer com os EUA o que tinha se passado com a França na década anterior, quando a guarnição francesa da base cercada de Dien Bien Phu teve que se render. A derrota marcou o fim do colonialismo francês na região.
Andrade descreve com realismo a base sitiada, alvo de foguetes, de granadas de artilharia e morteiro, além de estar ao alcance de atiradores de tocaia. Um errinho de revisão compromete a compreensão do drama: na página 94, um personagem comenta que de janeiro a março de 1968 as colinas em volta de Khe Sanh receberam mais bombas do que toda a Inglaterra na Segunda Guerra, "110 toneladas de bombas". Faltou a palavra "mil". O livro felizmente tem poucos erros do gênero (a música de Jimi Hendrix é "Foxy Lady", não "Fox Lady").
Os quatro repórteres mortos têm seus nomes reais usados no livro, assim como personagens conhecidos, como o coronel David Lownds, comandante da base de Khe Sanh, ou os jornalistas Peter Arnett, e Sean Flynn (também morto na guerra, era filho do ator Errol Flynn). Os personagens brasileiros têm nomes que podem permitir uma fácil identificação. Por exemplo, o jornalista José Hamilton Ribeiro, da antiga revista "Realidade", tem o acidente em que pisou em uma mina descrito no livro. Só que o personagem se chama José Airton Rodrigues, e a revista chama-se "Verdade".
Apesar de não haver nenhuma invencionice na descrição dos fatos básicos, a opção pelo romance frustra um pouco quem gostaria de saber mais sobre o real trabalho de Andrade e seus colegas na cobertura dessa guerra fundamental do século 20.
Pois esse foi um conflito em que a realidade superou em muito a ficção, algo que pode ser resumido em uma frase: "Tivemos de destruir Ben Tre para salvá-la", disse em 1968 um major não-identificado ao correspondente neozelandês Peter Arnett.


Bao Chi, Bao Chi - Um Romance da Guerra do Vietnam    
Autor: Luís Edgar de Andrade
Editora: Objetiva
Quanto: R$ 29,90 (284 págs.)




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