São Paulo, sábado, 22 de junho de 2002

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"QUEIMADO QUEIMADO, MAS AGORA NOSSO! - TIMOR: DAS CINZAS À LIBERDADE"

Obra conta histórias comuns em meio a dramas absurdos

DA REPORTAGEM LOCAL

Como diz o "Manual da Redação" da Folha, "o jornalista precisa encarar o fato com distanciamento e frieza, o que não significa apatia nem desinteresse". Essas palavras vêm a calhar para descrever o livro de Rosely Forganes sobre Timor Leste.
Pois foi justamente o seu interesse, ou melhor, sua paixão pelo mais novo país do planeta que fez ela voltar mais de uma vez ali, experiência agora narrada em livro e antes nas transmissões para a rádio Eldorado.
A série radiofônica "Vozes do Timor", que vem encartada no livro na íntegra, ganhou o Prêmio Vladimir Herzog de Jornalismo e Direitos Humanos em 2001.
É uma longa história. Em 75, o governador português abandona Dili, capital de Timor Leste, em meio a uma guerra civil que a vizinha Indonésia, dona da outra metade da ilha, usa como pretexto para anexar toda ela. Em 98, com a queda do ditador indonésio Suharto, anuncia-se que Timor Leste terá um referendo para decidir seu futuro -independência ou manter a anexação.
Em 4 de setembro a ONU anuncia que a independência teve 78,5% dos votos. Só em 15 de setembro o órgão aprova criação da força de intervenção. Rosely chega em Dili no começo de outubro, e já não há mais vagas no hotel Turismo, queimado, que serve de quartel-general para a força internacional. Por sorte ela vai parar em um convento abandonado.
Convivi com Rosely nesses dias, o que me torna um "personagem" citado em alguns trechos no livro. Entrevistamos juntos várias pessoas -como o português José Esteves Serra, então com 70 anos, o "vovô Serra", ou a fantástica dona Manuela dos Santos, que teve a casa queimada e se refugiou no convento para grande sorte dos jornalistas, pois era excelente cozinheira. Esse é o maior charme do livro e das gravações: os diálogos com os timorenses que foram colhidos no meio de um conflito brutal.
É fácil de entender a paixão de Rosely pelo país, que nunca chega a ser piegas. Os timorenses são de fato um povo extremamente simpático, com quem os brasileiros rapidamente ficam à vontade.
"Aos cadáveres, Antônio!", começa um dos capítulos do livro. Eu mesmo tinha pensado em usar essa frase em um texto que acabei não escrevendo. Estávamos em um carro com jornalistas portugueses, e um deles diz a frase ao motorista para irmos em busca dos restos carbonizados de uma família. O livro mescla bem situações de humor involuntário com o drama de um país em que cidades foram 70% destruídas.
(RICARDO BONALUME NETO)


Queimado Queimado, mas Agora Nosso! - Timor: Das Cinzas à Liberdade     
Autora: Rosely Forganes
Editora: Labortexto Editorial
Quanto: R$ 49 (507 págs.)




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