São Paulo, terça-feira, 22 de junho de 2004

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Mostra inclui clássicos e único roteiro de Beckett

CRÍTICO DA FOLHA

Samuel Beckett, o dramaturgo irlandês, escreveu o roteiro inspirado na fórmula doutrinária do filósofo George Berkeley: "Esse est percipi" (ser é ser percebido). A direção coube ao amigo Alan Schneider, que morreria atropelado 20 anos depois, ao cruzar a rua para postar carta a Beckett.
"Filme" (1965) é outra raridade da mostra. Um homem sem rosto se depara, em seu quarto, com os vestígios de seu passado. Rasga as ilustrações da parede, as fotos da família, põe os animais para fora, cobre o espelho, livra-se dos olhos de Deus e do mundo, mas continua preso à percepção de si mesmo. É o rosto de Buster Keaton que se desvela então. Na figura cansada do velho cômico do cinema mudo, em sua silenciosa e moribunda pantomima, o universo beckettiano encontra sua perfeita encarnação fílmica.
Outro destaque é "A Grande Garganta" (1901), uma das primeiras experiências de auto-reflexividade da história. Contrariado, um passante se aproxima da câmera até engoli-la em primeiro plano. No clássico do gênero "Um Homem com uma Câmera" (1929), Vertov revela a atividade cinematográfica como mais um ramo da produção industrial, justaposta ao mundo do trabalho.
Em "O Desprezo", Godard fala sobre um casal e um filme que se desfazem, mas é, no fundo, sobre sua prostituição de artista. Em "Oito e Meio", Fellini faz de sua crise criativa o manancial para uma obra-prima. Em "O Instante de Inocência", Mohsen Makhmalbaf dá continuidade à virada auto-reflexiva do cinema iraniano, iniciada pela história do seu sósia no "Close Up", de Abbas Kiarostami. (TMM)


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