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Becker expõe contradições da vida moderna
ROGÉRIO EDUARDO ALVES
FREE-LANCE PARA A FOLHA
A trilha aberta pelos versos de
Paulo Becker, 40, em meio à corrosão a que está sujeito o mundo
contemporâneo leva da incomunicabilidade à morte, sem deixar
escapar, no meio do caminho, as
(tentativas de) relações humanas
e a degradação dos objetos.
"Entro na cidade entoando a
justiça e o amor / apaixonado como Maiakóvski / falando sozinho
com as outras pessoas." Esta a
abertura de "Luas de Neon", que,
mesmo antes de ser livro, tinha
versos estampados nas janelas
dos ônibus de Porto Alegre (RS)
para todo mundo ler -parte do
projeto Poemas no Ônibus, promovido pela prefeitura daquela
cidade. Ironia?
"Foi uma experiência muito interessante embarcar em um ônibus, geralmente lotado, em cujas
janelas figurava um poema meu.
Isso deu-se no início dos anos 90.
Era inevitável acabar observando,
dissimuladamente, se alguém esbarrava com os olhos no poema e
se detinha nele, ou se todos estavam atentos a outras coisas. E
quase sempre o poema permanecia invisível aos outros passageiros", lembra o hoje professor de
teoria e crítica literária da Universidade de Passo Fundo, autor de
"Mário Quintana: as Faces do Feiticeiro" (1996).
Consciente da necessidade de
comunicar, esse gaúcho de Dois
Irmãos não se contenta com a rotina do falar sozinho e a enfrenta
mantendo um olho respeitoso no
leitor. "Busco evitar sempre que
possível a produção de metapoemas, não só porque Pessoa,
Drummond, João Cabral e outros
já exploraram com maestria os
meandros e percalços da criação
poética em poemas inigualáveis,
como também porque, ultimamente, esse assunto tem sido explorado até a náusea por muitos
poetas, e penso que isso acaba por
afastar o leitor do texto poético".
diz Becker.
"A poesia fica falando de si mesma e se esquece de dizer o mundo,
de transmitir uma emoção do
mundo. Penso que a poesia seja
justamente isso, traduzir em palavras e ritmos não uma visão do
mundo, mas uma emoção do
mundo. E, quando os poetas conseguem fazer isso, sempre encontram leitores, ainda que poucos."
A facilidade com que se lê os
poemas de Becker parecem não
condizer com a densidade dos temas abordados. Influenciada pela
visão do cotidiano de Manuel
Bandeira e contaminada pela corrosão drummondiana, a mensagem chega clara, sem obstáculos,
potencializando o efeito devastador de suas palavras.
Métrica
A frieza com que Becker caracteriza o agora e suas agruras tem
na métrica dos versos seu emblema. Em tempos que muitos escritores só vêem possibilidade de expressão por versos livres, Becker
encontra medida.
"Eu ainda não publiquei sonetos, mas venho utilizando cada
vez menos o verso livre. É muito
difícil resolver bem um poema em
verso livre. E, depois, há todo esse
barulho dos versolibristas atuais,
e os textos de muitos deles me parecem antes prosa versificada do
que poesia. Então fico temeroso
de que o ouvido do público ensurdeça aos ritmos mais fluidos do
verso livre, pela superexposição a
essa forma."
É verdade que, neste "Luas de
Neon", o poeta ainda usa a forma
livre, que não deve comparecer,
porém, nos seus novos textos, que
serão reunidos sob o título, ainda
provisório, de "Paralelepípedos":
"Será composto de séries de seis
sextilhas hexassílabas. É um exercício de contenção, talvez uma
forma de escape ou compensação
diante do caos que nos cerca".
Enquanto trabalha mais contenção para o futuro, Becker faz
de seus versos, neste que é seu terceiro livro de poesia -os dois primeiros foram "Alta Tensão" e
"Meus Demônios Cantam"-,
um caminho para a morte: "Neste
domingo chuvoso, como tantos
de tuas visitas,/dou na tua sepultura, na cidade em que vieste
morrer. (...) Vó, chega para lá, dá
um lugar para mim." Única saída?
"Procuro expor em meu livro
algumas contradições da vida
contemporânea, que nos colocam
como pêndulos a oscilar entre os
extremos. Mas não coloco a morte como meta, a não ser em termos simbólicos. Muitas vezes é
preciso que uma parte de nós
morra para que a outra siga vivendo fortalecida, ou que determinada forma de ser seja abandonada
para que outra se inaugure."
LUAS DE NEON - De: Paulo Becker.
Editora: WS Editor (tel. 0/xx/51/3333-9965). Quanto: R$ 15 (96 págs.). Na
internet: www.wseditor.com.br.
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