São Paulo, segunda, 23 de março de 1998

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TELEVISÃO
"Por Amor" é prato cheio para os misóginos

TELMO MARTINO
Colunista da Folha

Também os misóginos estão enfurecidos com o Ratinho. Por sua causa, estão comendo morno ou até frio seu prato-feito de misoginia fornecido pela pensão. "Por Amor", muito pontual até o aparecimento desse roedor de ibope. Mas, uma vez entregue, morno ou frio, o prato não fica vazio.
Os mais famintos começam a refeição pela Isabel, a amante chantagista. De minissaia e meias pretas e rendadas, Cassia Kiss se comporta como uma serpente de maçã várias vezes mordida. Enrosca-se em sua vítima cada vez mais cruel em sua ambição. O assustador é que a maldade de seu sorriso sugere uma existência independente das câmeras.
Já os misóginos mais óbvios mordem primeiro a Helena, a do crime maternal hediondo. Ela é uma criação da Regina Duarte, namoradinha do Brasil por volta de 1968. 1968? Isso mesmo, o ano que não devia ter começado.
Como uma turista de pernas arqueadas, ela caminha muito perto do mar, de chapéu e saia mijona. Iemanjá, por exemplo, não aguenta mais. Mudou-se do litoral do Rio e, cansada de tanta culpa, não volta nem para pegar os presentes de fim-de-ano. Pode ganhar aquele diário confessor, que usa uma almofada de sofá como as sete chaves de seus segredos.
Os mais escandalosos em sua misoginia preferem a Branca, a vilã caricatural da Susana Vieira. Sempre vestida para sair, ela fica presa ao seu dry martini e ao seu sofá caseiros.
Num golpe que parece mais da atriz que da personagem, ela tirou de cena a Carolina Ferraz, sedutora universal em sua alegria e beleza, só para ganhar tempo para monólogos malvados e esnobes. A insistência no mesmo tom e inflexões permitia que, fechando os olhos, o telespectador, visse e ouvisse a Rogéria, um travesti também de longa duração.
A Eduarda (Gabriela Duarte) e sua mochila vazia, os misóginos de estômago fraco se recusam a ver. Só prestaram atenção em sua imitação do Titanic. Um naufrágio provocaria a morte sempre adiada da mãe que só é filha. Ela desembarcou mais irritante porque feliz, perpetrando um anticlímax imperdoável.
Na falta demorada da alegria da Milena, só a emergente da Françoise Forton desaponta misógino. Ela é tão digna em seu comportamento de mãe e mulher, que o queridinho Atílio (Antônio Fagundes) virou garoto-propaganda de Alphaville, onde a briga é só das Mercedes com os BMW.



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