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MÚSICA ERUDITA
Concertos realizados no Brasil e no exterior prestam tributo ao maestro e compositor de Santa Catarina
Edino Krieger faz 70 anos e é homenageado
CARLOS BOZZO JUNIOR
especial para a Folha
Na última terça-feira, o maestro
e compositor Edino Krieger completou 70 anos e foi homenageado
em um concerto no Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio de Janeiro.
Krieger nasceu em Brusque (SC)
e, aos sete anos, já estudava violino com seu pai. Aos nove, era músico atuante e recebeu, aos 15
anos, uma bolsa de estudos oferecida pelo Estado de Santa Catarina
para estudar no Conservatório do
Distrito Federal, no Rio, onde passou a residir.
Foi quando Krieger conheceu o
professor e maestro Hans Joachim
Koellreutter, com quem teve aulas
particulares de composição, harmonia e contraponto. Koellreutter
foi o idealizador do grupo Música
Viva, que teve como integrantes
Cláudio Santoro, Eunice Catunda
e Guerra Peixe, entre outros.
O grupo deu a Krieger seu primeiro prêmio como compositor,
aos 17 anos.
Em 48, ganhou uma bolsa para
estudar nos Estados Unidos, com
Aaron Copland no Berkshire Music Center.
De volta ao Brasil, o compositor
passou a dividir seu trabalho de
criação com a luta para abrir espaços para a música de concerto,
dando maior ênfase ao autor brasileiro. Entre as criações de Krieger, estão a Orquestra Sinfônica
Nacional e a Bienal da Música.
Leia, a seguir, a entrevista que o
maestro concedeu à Folha, por telefone, de sua casa, no Rio.
Folha - Como estão sendo comemorados seus 70 anos?
Edino Krieger - No dia do meu
aniversário, foi realizado um concerto em minha homenagem no
Centro Cultural Banco do Brasil,
aqui do Rio. Esse concerto foi o
terceiro de uma série de cinco em
meu tributo.
No exterior, temos prevista uma
estréia européia, em Bruxelas, na
Bélgica, de um concerto para dois
violões e orquestra de cordas, que
será executado pelos violonistas
Sérigo e Odair Assad, o Duo Assad.
Depois, eles seguem para Espanha
e Alemanha, ocasião em que irão
gravar e editar o concerto, que poderá ser transformado em CD.
Folha - O que o sr. pretende realizar como presidente da Academia
Brasileira de Música?
Krieger - A Academia Brasileira
de Música é uma instituição de caráter evidentemente honorístico,
mas no meu entendimento não
deve ser somente isso. Ela deve ter
uma atividade executiva, uma programação de divulgação, de documentação da música brasileira. A
gestão anterior teve como meta
normalizar a situação administrativa, legal e financeira. O que foi
feito de forma brilhante, mas, agora, quero me concentrar mais na
parte de atuação da academia, tornando-a uma instituição realmente útil à vida musical do país.
Entre as metas traçadas, está a
aquisição de uma sede própria para a academia, pois ela está funcionando em um lugar provisório.
Além disso, vamos criar uma atividade periódica de divulgação da
música brasileira, convidando
compositores para apresentarem
suas obras e darem palestras. E daremos continuidade a alguns programas que estão sendo desenvolvidos, como a elaboração de uma
bibliografia musical brasileira.
Folha - Qual o segredo para conciliar a carreira artística com a administrativa?
Krieger - Não sei se consegui
conciliar isso muito bem, porque,
na verdade, minha carreira artística ficou um pouco prejudicada.
Por outro lado, essas atividades
administrativas são uma forma de
sobrevivência dos compositores
no Brasil, já que o país não dá ao
compositor condições de sobreviver com seus próprios trabalhos.
Eles têm de se dedicar a atividades
didáticas, como professores, intérpretes, regentes, ou exercer cargos de administração da vida musical, como foi meu caso. Um dos
últimos cargos de chefia que exerci
foi o da Funarte. Isso foi feito com
muita seriedade e tomou muito do
meu tempo, o que, inevitavelmente, fez com que eu colocasse, mais
uma vez, minha carreira criadora
aos trancos e barrancos.
Folha - Paquito D'Rivera, músico
clarinetista, há pouco tempo lançou um CD com músicas de câmara
de compositores sul-americanos.
E, em recente entrevista, disse que
"a valiosa contribuição dos compositores do Novo Mundo para a
música de concerto é tão extensa,
fresca e variada como incompreendida e subutilizada por grande parte dos intérpretes do gênero
clássico, culto ou erudito, que têm
se dedicado exclusivamente à música européia dos séculos 18 e 19,
ignorando a formidável produção
dos compositores a oeste do Oceano Atlântico". O sr. compartilha da
mesma idéia?
Krieger - Sem dúvida alguma. O
que acontece, principalmente, é a
dificuldade de acesso a essa produção. Eu não culpo os intérpretes. Geralmente, diz-se que eles
não têm interesse pela música brasileira. Não é verdade. Sou testemunha de que eles têm um grande
interesse pela divulgação de nossa
música.
Frequentemente, compositores
são solicitados para escreverem
peças a serem executadas. Ao menos comigo, isso ocorre quase todos os dias. Agora, as obras que já
existem, como as do século passado, não são acessíveis aos intérpretes. Então, um regente que fizera um programa inteiro de música sinfônica brasileira fica perdido
num labirinto de procuras e buscas. Não sabe onde buscar ou por
onde começar. Não existe sequer
um tema organizado de informação.
Essa era uma das propostas que
levei para a Funarte, e, até hoje,
não foi possível realizá-la. Falta no
Brasil uma instituição que centralize essa responsabilidade de saber
o que existe de criação musical no
país, que pesquise, cadastre e informatize essa informação, colocando-a ao alcance fácil dos intérpretes e estudiosos. A Biblioteca
Nacional realiza um trabalho de
recuperação de partituras, para
que possam ser colocadas à disposição de interessados, via Internet.
Mas, é, ainda assim, um trabalho
feito de maneira muito precária,
muito modesto em relação ao
acervo e à produção toda que existem no Brasil.
Folha - O que é música contemporânea?
Krieger - Em 23 anos de Bienal
da Música, chegamos a um consenso que música contemporânea
é a música que se faz hoje. É um
conceito meramente cronológico,
e não de natureza estética, ou uma
definição excludente. Portanto, a
música tradicional é música contemporânea, se for feita hoje. Não
é o caráter da obra que a define como contemporânea.
A característica principal da nossa cultura, inclusive na área da
música, é exatamente a diversidade, a pluralidade. Esse pluralismo
é que é conceitual. Se a música
contemporânea soa como de vanguarda, nacionalista, tradicional
ou de pesquisa, isso não importa.
Cada compositor é que escolhe sua
vertente.
Folha - Quem são considerados
valores permanentes nesse tipo de
música?
Krieger - Os grandes compositores, que já são considerados os
clássicos da música contemporânea brasileira, da outra fase são
Camargo Guarnieri, Villa-Lobos,
Francisco Mignone, Cláudio Santoro, Guerra Peixe, Radamés Gnatalli. E, da geração mais nova, temos alguns que se destacam como
o Almeida Prado. Mas, o fio do
tempo ainda nos trará, sem dúvida, novos valores.
Folha - Nesses 70 anos, o sr. deixou de fazer alguma coisa que
gostaria de ter feito?
Krieger - Eu acho o tempo um
fator terrivelmente angustiante,
porque ele passa depressa demais.
Eu me vejo com 15 anos, chegando
no Rio de Janeiro, e parece que foi
ontem. E, de repente, tem todo um
caminho já percorrido. E uma porção de coisas que eu gostaria de fazer e não fiz. Principalmente na
área da criação, eu gostaria de ter
uma produção mais significativa
em termos numéricos.
Eu me acho um compositor que
tem uma produção pequena, de
catálogo reduzido, que pode ter
até alguma significação, mas acho
que o crivo do tempo é que vai determinar se minhas coisas têm valores e condições de permanência.
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