São Paulo, segunda, 23 de março de 1998

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O REBELDE
Liam brilha com desdém

PATRICIA DECIA
da Reportagem Local

Deve ser bastante difícil ser irmão de Noel Gallagher. Mas, no caso de Liam, vocalista e imagem do Oasis, mais do que dificuldade, parece haver perigo.
O "kid" disputa com o irmão esbanjando, na mesma proporção, um talento de natureza diferente, talvez complementar, dificultando as formas de comparação.
Pois, se a música de Noel é um espelho competente e genial das referências pop das últimas quatro décadas, Liam personifica e dá voz a essas referências.
Alan McGee, que descobriu a banda e tornou-se seu manager, disse que "Liam tem a atitude de Johnny Rotten e canta mais que o Lennon", ficando com o primeiro lugar no top 5 de vocalistas de rock. Fora os comprometimentos, a afirmação contém verdades.
No palco, Liam age não como quem quer conquistar a platéia, mas como quem já a conquistou. Assim, como em alguns relacionamentos amorosos, joga com ela o jogo do desdém: quanto menos ele pede, mais ela dá.
Uma outra referência é a sua inconsequência quase infantil. Por isso, parte do público, especialmente masculino, o vê como um tipo de palhaço irresponsável.
Para as garotas, essa faceta tem outro atrativo: é a porção garoto malvado que vive o presente, que um dia está louco e, no outro, mostra sinais da ressaca.
Todo o tempo, Liam divide o poder no palco com Noel. Mesmo quando o irmão libera o "guitar hero" ao máximo, ele vai, pelas beiradas, garantir sua presença.
Um bom exemplo, no show de ontem, em São Paulo, ocorreu quando Noel deixou o palco ovacionado, após um set acústico e o hit "Don"t Look Back in Anger".
Liam se impôs novamente com "Wonderwall", sem deixar cair nem por um segundo a satisfação do público. Nesse momento, ele tem algo de McCartney, cantando uma perfeita balada.
Até aí, ótimo. O perigo reside no fato de que, nesse jogo de personas, talvez more algo de trágico. É provável que nada aconteça, ou que seja tudo calculado. Mas a possibilidade existe, e nada é mais importante para o pop.



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