|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LIVROS/LANÇAMENTOS
"GENOMA"
Complexidade vai além da genética
ISABEL GERHARDT
DA REPORTAGEM LOCAL
Que ninguém espere que o
livro "Genoma - A Autobiografia de uma Espécie em 23 Capítulos", de Matt Ridley, apresente
histórias dos bastidores da corrida da conclusão do genoma humano. Não há nem sequer uma
análise sobre os resultados divulgados este ano, como o número
surpreendentemente baixo de genes encontrados ou a presença de
genes de origem bacteriana.
Até porque o livro foi lançado
ano passado nos EUA, antes mesmo do anúncio de obtenção do
rascunho do genoma, feito em junho, na Casa Branca, por Francis
Collins e Craig Venter.
Quando, em fevereiro deste
ano, o consórcio de instituições
públicas e a empresa Celera anunciaram a "conclusão" do sequenciamento do genoma humano,
foram categóricos dizendo que o
trabalho está apenas começando.
Isso significa, na prática, que
existem "buracos" a serem preenchidos na sequência, genes a serem identificados e mais importante: é preciso descobrir o que fazem todas essas letras A, C, G e T,
que juntas carregam a informação de como o homem é feito.
Ou seja, qualquer afirmação feita com base no genoma hoje ainda poderá ser objeto de revisão.
O que Ridley se preocupa em
mostrar é que não só o homem,
mas qualquer forma de vida é
muito mais complexa do que um
mapa de 3 bilhões de letras (o tamanho do genoma humano) é capaz de registrar ou sugerir.
Para isso, ele usa uma estratégia
interessante. Ao descrever um gene característico de cada um dos
23 cromossomos que compõem o
material genético humano, o autor aproveita para relacioná-lo a
questões não só ainda em aberto
na biologia, mas que despertam o
interesse do público leigo.
Até que ponto inteligência é hereditária? Existe algum gene relacionado à opção sexual? O que é
envelhecer? Esses são exemplos
de temas que foram e são objetos
de discussão científica.
Nos últimos anos, o número de
organismos que tiveram o genoma decifrado cresceu vertiginosamente. Já são mais de 50 micróbios completos, pelo menos uma
planta, um verme, um inseto, um
roedor e, culminando essa "cadeia evolutiva", o homem.
De forma cada vez mais frequente, genes são apresentados
como responsáveis pelo colesterol
alto, pelo diabetes ou pela vontade de comer chocolate.
Esse tipo de atitude, além de
criar a falsa idéia de que somos
apenas o que está escrito em nossos genes, acaba provocando uma
reação oposta, igualmente exagerada: o determinismo ambiental,
em que alguns afirmam que o homem é o que o meio social e cultural estabelecem.
Esse talvez seja o maior mérito
da obra de Ridley, jornalista com
doutorado em zoologia pela Universidade de Oxford. Evitar tanto
o determinismo genético como o
ambiental para tentar entender o
que nos faz humanos.
Afinal, diz Ridley, "somos cerca
de 98% chimpanzés". Descobrir o
que faz a diferença é trabalho para
décadas e muita gente, das mais
diversas áreas do conhecimento
humano. Essa a mensagem que
Ridley procura transmitir.
Genoma - A Autobiografia de
uma Espécie em 23 Capítulos
Genome - The Autobiography of a
Species in 23 Chapters
Autor: Matt Ridley
Tradução: Ryta Vinagre
Editora: Record
Quanto: R$ 40 (400 págs.)
Texto Anterior: "Abraçado ao Meu Rancor": A dor no país dos tapinhas que não doem Próximo Texto: Resenha da Semana - Bernardo Carvalho: O último dos homens Índice
|