São Paulo, quinta, 23 de julho de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

TEMPORADA PRIMAVERA-VERÃO 98/99
Desfiles têm camponesas, deusas e drags

João Wainer/Folha Imagem
Macacão da volta às origens de Alexandre Herchcovitch


ERIKA PALOMINO
Colunista da Folha

Dia de diversidade, expectativas, algumas surpresas e outro punhado de frustrações. Nesta terça-feira no MorumbiFashion Brasil, anteontem, cinco desfiles aconteceram no evento, que segue até sexta-feira mostrando as coleções para a primavera-verão 98/99, no Jockey Clube de São Paulo, zona sul da cidade.
O zum-zum-zum começou logo de manhã, no desfile divisor de águas e de opiniões de Fause Haten, unificando (de novo) suas marcas Fause Haten e Der Haten (leia texto nesta página).
A tarde recomeça com as "deusas" da vida real da Viva Vida, passa pelas descompromissadas camponesas do mineiro Renato Loureiro; seguida pela noite sempre animada de Alexandre Herchcovitch, para terminar na morna ceia servida pela moda da Iódice.
Dentro de uma moda voltada para o aspecto comercial, a Viva Vida dividiu, nas "personalidades" das deusas gregas, os segmentos de sua linha de produção. O melhor -e mais leve- foram as jovens colegiais/tenistas (Deméter), que abriram o desfile de estrutura literal e previsível em cardigãs, camisas e calças retas. Tentando abocanhar parte do segmento aeróbica fashion, as Ártemis acionaram também o cáqui e as "cargo pants" (calças masculinas de cintura baixa, palavra citada uma em cada cinco nesta temporada).
Não rolaram os terninhos cinza de Hera nem as Atenas solteironas. Já as Perséfones vieram para a noite com as unhas dos pés pintados de vermelho e vestidos-camisola de cetim, bem caretas.
As camponesas de Renato Loureiro despertaram no público a vontade de se aprumar para acompanhar os detalhes dos amassados, dos bolsos, das sobreposições, pregueados, bordados e aventais.
Principalmente no começo. Aos poucos, entretanto, o japonismo, desta vez à caipira, passou a dar sinais de esgotamento estilístico. E de apresentação também.
Os mesmos looks em branco (que já passavam duas vezes pelo chão de madeira clara) voltavam depois em preto, ocasionalmente vestidos pela mesma modelo. Poderiam ficar de fora as mules de saltinho, os macacões e os ternos em azul-turquesa.
Enquanto isso, lá fora, brilhavam as drag queens, onde Marcia Pantera reinava. É que viria depois Alexandre Herchcovitch, reeditando agora no maior evento de moda do país os macacões com atracadores e atitude sadomasquista com que Marcia fazia seus shows, lá em 93.
Herchcovitch, 27, fez praticamente uma retrospectiva, tipo melhores momentos (lingerie, látex, aeróbica, alfaiataria), em novos tecidos e cores, com distribuição em escala industrial garantida pela Zoomp e um evidente aprimoramento técnico. Perfeita para vôos internacionais e editoriais de moda.
A atitude é sexy (sem ser pesada), em tom de fim de milênio. Mas a julgar pelo desfile, a consumidora tem pouca roupa para comprar. Mais sorte têm os homens, comerciais, fashion, modernos, coloridos em roxo e laranja -a escolha mais forte para o verão do estilista.
No feminino, as estrelas são mesmo os vestidos de tiras, habilmente modelados, em estratégicas e reveladoras fendas de resultado gilets. Já a alardeada linha jeans vem às vezes tão básica que entra no esquema "hype invisível" (nem parece Herchcovitch).
A longa noite terminou com Iódice, que por sua vez desistiu de uma vez de mostrar básicos e mostrou só o fashion. Valdemar Iódice quer sempre mais. Usou materiais sintéticos para seguir o caminho dos chamados modernistas (Helmut Lang e afins), mas algo aqui parece fora do lugar.
O tal corte geométrico (inspiração no cubismo?) fica pesado e desproposital para a cliente da marca. Afinal, para quem foi feito o verão da Iódice?
Com o mesmo não-motivo pelo qual o desfile inverteu de repente o sentido da entrada das modelos na passarela, assim são muitas das peças da Iódice. É importante saber o por que de fazer as coisas. Só saber onde cantou o galo não é mais suficiente para a moda brasileira. Queremos mais.




Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.