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RETROSPECTIVA BUÑUEL
Mostra traz títulos raros
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
O grande mérito da Retrospectiva Buñuel promovida pela 24ª
Mostra de Cinema de São Paulo é
o de incluir, ao lado de obras-primas muito reprisadas, como "Um
Cão Andaluz" e "Bela da Tarde",
alguns títulos mais raros do diretor espanhol, sobretudo de sua fase mexicana. É o caso, por exemplo, de dois filmes excepcionais
programados para hoje, os pouco
vistos "Ensaio de um Crime"
(1955) e "Subida ao Céu" (1952).
O primeiro, homenageado por
Almodóvar em "Carne Trêmula",
pode ser visto, sob a capa enganosa da trama policial, como um dos
mais perfeitos estudos de Buñuel
sobre o poder do desejo e da imaginação contra a tirania do "real".
A história narrada diz respeito a
um homem rico, Archibaldo de la
Cruz, que acredita ter o poder de
causar as mortes que deseja. A engenhosa arquitetura do relato, em
flashbacks superpostos, levou
François Truffaut a exaltar a capacidade de Buñuel como "construtor", na contramão da sua fama
de anárquico e destruidor.
De fato, como mostra Truffaut,
a astúcia de Buñuel é tamanha
que o espectador sai do cinema
com a impressão de que testemunhou os inexistentes crimes do
protagonista.
Mais do que à habilidade narrativa do diretor, entretanto, a façanha se deve talvez a seu personalíssimo modo de dar a ver o mundo, no qual a ação imaginada, sonhada ou desejada tem a mesma
espessura e a mesma intensidade
da ação "acontecida".
Em "Subida ao Céu", a história
de um rapaz que tem de viajar a
um vilarejo enquanto o aguardam
em casa a mãe moribunda e a noiva virtuosa, essa transfiguração
do real pelo desejo ressurge.
Tentado por uma jovem sedutora, o rapaz transforma imaginariamente o ônibus imundo em
que viaja num leito de amor repleto de plantas e flores. Essas imagens oníricas têm uma força que
lembra a do amor louco do casal
de "L'Age d'Or".
Tudo isso ocorre no quadro de
uma deliciosa sátira política e de
costumes, em que o México aparece condensado nos poucos personagens que viajam no ônibus. O
incrível "Nazarin" (1958), também programado para hoje, não é
tão desconhecido: ao lado de "Los
Olvidados" e "O Anjo Exterminador", é tido como um dos pontos
altos de Buñuel no México.
É, ao lado de "Viridiana" e "Via
Láctea", o filme em que o cineasta
leva mais longe seu questionamento da fé católica. Como Viridiana, o quixotesco padre Nazarin só encontra o desastre quando
tenta praticar na Terra as palavras
de Cristo.
(JGC)
Subida ao Céu
Produção: México, 1952
Quando: hoje, às 15h45 (Vitrine), e
amanhã, às 14h (Cinesesc)
Ensaio de um Crime
Produção: México, 1955
Quando: hoje, às 13h (Masp), amanhã, às
17h (Cinemateca), e sexta, às 13h45
(Cinearte)
Nazarin
Produção: México, 1958
Quando: hoje, às 12h (Cinearte), e
quinta, às 14h (Vitrine)
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