São Paulo, terça-feira, 23 de outubro de 2001

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Estrangeiros valorizam processo criativo

FREE-LANCE PARA A FOLHA

Vindos da França, Inglaterra, Áustria e Alemanha, os coreógrafos estrangeiros que participam da Mostra Internacional Sesc de Dança representam uma vertente de criadores que tendem a valorizar mais o processo criativo do que o produto final de suas concepções.
"Nossa proposta é discutir a tríade corpo-tempo-dança, ou seja, entender como o corpo está inserido no seu tempo e produz dança", diz Rosana Cunha, coordenadora técnica da mostra.
O diferencial, entre os convidados estrangeiros, deve ficar por conta do grupo À Fleur de Peau, que a brasileira Denise Namura dirige na França com o alemão Michael Bugdhan.
Dessa companhia sediada em Paris vem somente a dupla de diretores, que interpretará "Histoires Courtes en Plusieurs Cris" e "Rétrospective en Duo". Em ambas, enfocam a condição humana por meio de uma linguagem que funde dança, teatro e mímica (dia 29, às 20h, no Sesc Ipiranga).
O grupo do coreógrafo francês de origem albanesa Angelin Preljocaj, que encerra a mostra na próxima semana, é um dos destaques da programação estrangeira. Além das companhias do austríaco Willi Dorner e do alemão Thomas Lehman, o evento traz o suíço radicado na Inglaterra Gilles Jobin e o francês Boris Charmatz.
"Não concebo a dança a partir do vocabulário coreográfico tradicional. Procuro estimular reflexões sobre a verdadeira razão do movimento, que existe no corpo que funciona, mesmo quando permanece imóvel. Entretanto, considero-me um coreógrafo, embora eu faça parte dos criadores que hoje, na Europa, atuam no limite do que é dança e do que não é identificado como dança", diz Jobin, que abre a mostra com "The Moebius Strip".
Ao extrair o título de seu espetáculo das histórias em quadrinhos de Moebius, Jobin procurou representar o movimento sem fim. "Moebius é uma figura bidimensional, com uma só face, que avança, mas jamais chega ao outro lado. Sua imagem, para mim, representa o infinito. Por isso, achei que seria um bom nome para minha coreografia, que representa uma viagem no tempo, algo que começa e jamais pára, como uma transmissão de vida."
Depois da sombria "Braindance", apresentada em São Paulo ano passado, que salientava a morte física do corpo, Jobin decidiu explorar um viés mais espiritual em "The Moebius Strip". "Agora falo de um corpo que representa mais plenamente o espírito. Na concepção coreográfica, lido com o que chamo de movimento organicamente organizado. Na simplicidade do espaço cênico, os bailarinos se deslocam no interior de uma rede que delimita o espaço. Os movimentos são feitos com muita liberdade de escolha, mas não há improvisações", acrescenta Jobin que, como nas criações anteriores, usa música de Franz Treichler.
Depois de Jobin, a mostra traz o francês Boris Charmatz, que vem ao Brasil pela primeira vez com duas criações: "A Bras le Corps" e "Aatt Enen Tionon". Ex-bailarino da companhia de Régine Chopinot, Charmatz criou a primeira peça em parceria com Dimitri Chamblas.
"A escritura da peça é estrita, mas as questões que propõe, de acordo com sua interpretação e recepção, estão em movimento permanente. Trata-se de uma criação que se transforma radicalmente, dependendo do lugar onde é apresentada. Sua proposta é fazer emergir o dançarino como produtor da imagem do corpo, o qual é influenciado, por exemplo, pela fadiga ou pela ausência de distância entre ele e a platéia", afirma Charmatz.
Já "Aatt Enen Tionon" é uma criação só de Charmatz. "O título é uma espécie de poesia sonora, que compartilha o espetáculo. A cada intervenção da voz, a cada sílaba, nós interrompemos o processo da performance."
Segundo Charmatz, "Aatt Enen Tionon" suprime o contato habitual entre os intérpretes. "Não há a relação que normalmente une o grupo. Há um espaço comum, no qual foram eliminados os suportes comuns, como o toque. Mas, bizarramente, sem as referências habituais, se produz uma outra forma de comunidade, que escapa ao que havíamos imaginado no início do trabalho." (AFP)



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