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"JUHA"
Aki Kaurismäki homenageia a pureza
CRÍTICO DA FOLHA
Ao contrário de seu irmão
Mikka, também cineasta,
Aki Kaurismäki ("La Vie de Bohème") integra o primeiro time do
cinema europeu contemporâneo.
Depois de "Nuvens Passageiras" (1996), ele se dizia decidido a
parar -queria voltar a investir na
carreira de escritor-, mas o projeto de "Juha", quarta adaptação
cinematográfica do romance de
Juhani Aho, foi suficiente para demovê-lo da idéia.
O que não deixa de ser curioso:
afinal, essa homenagem à pureza
e à inocência do cinema mudo parece contrariar seu estilo usualmente lacônico e minimalista. Estilo que o filia ao cinema de Robert Bresson, via Jim Jarmusch.
Mas o silêncio sempre foi um elemento central do cinema de Kaurismäki. Além do mais, essa tentativa de recuperar a inocência dos
primeiros tempos é também típica do moderno cinema francês.
Os primeiros filmes da nouvelle
vague, filmes dos "filhos da cinemateca", também partiam dessa
proposição: retomar a inocência
do primeiro cinema por um desvio do saber. François Truffaut falava em recuperar a saúde do cinema mudo, e Jean-Luc Godard
dizia ser necessário pensar a história do cinema toda de novo, como que pela primeira vez.
O gesto de Kaurismäki é menos
histórico e mais puramente retrógrado: realizando uma versão
muda de "Juha", clássico finlandês cuja primeira adaptação data
de 1920, 70 anos depois da morte
do mudo, ele visa claramente nos
lembrar de uma inocência inelutavelmente perdida.
O romance de Aho trata da história do envolvimento da jovem
mulher de um velho camponês
com um belo viajante russo. Kaurismäki faz do viajante um playboy urbano, que conquista a camponesa para prostituí-la na cidade
grande. O "Juha" melô de Kaurismäki lembra os filmes americanos de Murnau ("Aurora" e "City
Girl") em sua visão da metrópole
como lugar da degenerescência,
do vício e do pecado.
É a visão dos críticos reacionários do começo do século diante
da modernidade urbana. Mas a
ingenuidade está mesmo na crítica, a exemplo da "metáfora" (típica do mudo) em que Kaurismäki
associa o sexo ao fluxo das águas
do degelo primaveril.
(TIAGO MATA MACHADO)
Juha
Direção: Aki Kaurismäki
Produção: Finlândia, 1999
Com: Sakari Kuosmanen, Kati Outinen,
André Wilms
Quando: hoje, às 22h10, no Unibanco
Arteplex; dia 27, às 21h40, na Sala UOL; e
dia 31, às 19h, no Cinemark Market Place
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