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Dirigida por Marco Tullio Giordana, minissérie que virou filme de 6 horas premiado em Cannes é apresentada hoje na Mostra
Família conta 40 anos de história da Itália
FRANCESCA ANGIOLILLO
FREE-LANCE PARA A FOLHA
São quase seis horas de filme.
Mas são quase 40 anos os cobertos por "A Melhor Juventude", do
italiano Marco Tullio Giordana,
que a 27ª Mostra Internacional de
Cinema de SP apresenta hoje -
em versão integral, dividida por
um intervalo de 30 minutos.
A extensão se explica na origem:
o projeto foi encomendado como
minissérie pela televisão estatal
italiana, a RAI - que queria contar um pedaço da história do país
de um "ponto de vista original",
como diz Giordana, 53. Para isso,
a rede encarregou os roteiristas
Sandro Petraglia e Stefano Rulli,
que convidaram o diretor com
quem trabalharam em "Pasolini,
um Delito Italiano" (1995).
No filme, a história italiana circula em torno dos lares de uma
mesma família, espalhados entre
a capital, Roma, a industrial Turim, e a mítica e pobre Sicília. "Petraglia e Rulli preferiram contar
os fatos privados da família Carati
e de seus amigos do que representar os grandes acontecimentos
que marcaram a vida italiana nos
últimos 40 anos. Estou de acordo:
deste modo, o enredo resulta
muito mais apaixonante e universal", pondera Giordana.
Os protagonistas são os irmãos
Nicola (Luigi Lo Cascio) e Matteo
(Alessio Boni). Muito próximos,
ainda que em tudo diferentes, têm
suas vidas mudadas, no verão de
1966, pelo encontro com Giorgia
(Jasmine Trinca), paciente de
uma clínica psiquiátrica, e a tentativa frustrada de livrá-la da rotina
dos eletrochoques.
Matteo entra para a caserna em
busca de colocar ordem no caos.
A partir daí, um lado sombrio se
desenvolve no rapaz antes inclinado às artes. Como policial, presenciará vários fatos históricos
que se seguem à sua decisão.
Nicola, estudante de medicina,
passa o resto das férias (e uns meses mais) numa viagem de mochilão até a Noruega. Na volta provocada pela notícia da grande enchente de Florença -quando jovens de toda a Itália se empenharam em salvar obras de arte -
decide dedicar-se à psiquiatria e à
luta antimanicomial, iniciada por
Franco Basaglia (1924-1980).
E assim seguem os irmãos Carati e seus circunstantes, conduzindo a segunda metade do século 20
na Itália. O artifício não é novo,
nem mesmo para Giordana que
defende vivamente que a história
"grande" se faz de pequenas histórias humanas - e poderia ter
resultado caricatural, se julgarmos improvável que um pequeno
núcleo de pessoas pudesse concentrar tantos símbolos da época.
O que permite que os personagens (encarnados com mestria)
pareçam pessoas, e não emblemas, é sua densidade psicológica,
que, somada a um "leitmotiv"
subjacente e o contraste entre a liberdade e sua privação, salva o filme de se tornar um "novelão".
Essas mesmas qualidades levaram ao "congelamento" da série.
"Os dirigentes da RAI ficaram
muito satisfeitos e comovidos.
Mas a rede perdera muito público
com uma série de programas errados, e os mesmos que haviam
amado "A Melhor Juventude" tiveram medo. Aristocrático demais,
refinado demais...", relembra.
E assim, incidentalmente, o filme foi parar primeiro na tela de
cinema, mais exatamente, do Festival de Cannes, onde levou o prêmio da seção "Un Certain Regard". Daí à carreira de sucesso
nas salas européias foi um pulo.
"Nunca estive tão ocupado", diz,
surpreso. Em tempo: o "produto"
será exibido, em quatro episódios, pela RAI 1, em dezembro.
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