São Paulo, sábado, 23 de outubro de 2004

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ARTES PLÁSTICAS

Em sua inauguração, instituição, que tem curadoria de Emanoel Araújo, atesta vínculos com São Paulo

Museu Afro-Brasil abre revendo estereótipos

FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

A reversão de preconceitos e estereótipos marca a inauguração, hoje, do Museu Afro-Brasil. Vinicius de Moraes disse que São Paulo é o "túmulo do samba", mas, logo na entrada do novo espaço, dezenas de retratos de sambistas paulistanos, como Nenê da Vila Matilde, realizados por Wagner Celestino, apontam que é preciso ter cuidado com generalizações.
Além da série de sambistas, a entrada do museu recebe ainda fotos realizadas por Augusto Militão no século 19, retratos distintos de "uma população que sumiu ou se mesclou à cidade", conta Emanoel Araújo, curador da nova instituição. "Buscamos abrir o museu com uma homenagem a São Paulo, afinal, é preciso mostrar logo de início os vínculos da cultura negra com a capital paulista." As mostras fotográficas são temporárias, ficam em cartaz até meados de novembro.
É no andar superior que se localiza a exposição permanente do museu, organizada a partir da doação de 1.100 peças do acervo de Araújo, que contam a presença do negro na cultura brasileira do ponto de vista histórico, religioso e artístico. Para visitar a mostra, há dois caminhos possíveis, um pelo corredor da arte, outro pelo da história.
Quem começar pelo corredor da arte defronta-se com uma série de trabalhos contemporâneos realizados por artistas negros ou que dialogam com a cultura afro-brasileira, caso dos totens de Jorge dos Anjos, das serigrafias de Rubens Valentim e das esculturas de Mestre Didi e do próprio Emanoel Araújo. "Há quatro obras minhas porque também sou filho de Deus. Sempre me excluí das exposições que organizei, mas achei que não deveria ficar fora desta." O segmento segue com fotos de Eustáquio Neves, Walter Firmo, Maureen Bisilliat e outros.
Depois da arte, o corredor da memória, onde o curador elenca, por meio de fotos, uma série de personalidades negras, de Carlos Gomes e Machado de Assis a Garrincha e Pelé. O final do segmento tem uma série de imagens de Madalena Schwartz, de outras personalidades, como a cantora Clementina de Jesus e Mãe Menininha do Gantois. Esse segmento termina com a parte das festas, onde estão máscaras e objetos da Cazumba do Maranhão e dos Folguedos de Reis, de Alagoas.
É na área chamada "Sagrado e Profano" que o museu começa a ganhar densidade de fato, ao mostrar a mestiçagem, por exemplo, da pintura de Manuel da Costa Athayde, que, ao pintar a igreja da Ordem Terceira de São Francisco, em Ouro Preto, retratou Nossa Senhora e os anjos à sua volta como negros, imagem reproduzida na mostra.
Daí em diante, martírio e perseguição são constantes e um totem representando a resistência elenca três heróis: Zumbi dos Palmares, Henrique Dias, líder da expulsão dos holandeses em Pernambuco, no séc. 17, e João Cândido, o almirante negro que comandou a Revolta das Chibatas, em 1910.
Um dos destaques desse corredor histórico é a reprodução de um navio negreiro, a partir de uma gravura de Rugendas, com sons do mar e de vozes em tom de sofrimento. "Isso pode assustar um pouco, mas a idéia é essa mesmo", diz Araújo.


MUSEU AFRO-BRASIL. Curadoria: Emanoel Araújo. Quando: abertura hoje, às 11h (para convidados); de qua. a seg., das 10h às 17h. Onde: pavilhão Manoel de Nóbrega (pq. Ibirapuera, portão 1, SP, tel. 0/xx/11/5908-1721). Quanto: entrada franca. Patrocinador: Petrobras.


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