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CRÍTICA
Diretor recicla clichês
do cinema em tom de chanchada para massas
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Ivan Cardoso pode ser definido como um José Mojica Marins que tivesse visto filmes de
Jean-Luc Godard e convivido
com Julio Bressane e Helio Oiticica. Dois novos filmes permitem
um duplo mergulho no universo
desse "primitivo de vanguarda".
Se "A Marca do Terrir" dá uma
idéia geral dos terrenos que Cardoso explorou antes de ingressar
no cinema propriamente comercial, a comédia "Um Lobisomem
na Amazônia" mostra o cineasta
em pleno domínio do estilo que o
consagrou a partir de "O Segredo
da Múmia" (1981).
A idéia básica é a de que, nessa
arte industrial, nada se cria e nada
se perde, tudo se recicla. O acervo
de imagens e sons criado ao longo
de um século é, para o diretor, um
tesouro a ser saqueado livremente, sob o signo antropofágico da
paródia e da chanchada.
Nas "quotidianas Kodaks", realizadas em super-8 pelo diretor no
início dos anos 70, temos uma arqueologia viva da contracultura
da época: Torquato Neto encarnando um Nosferatu tropical, orgias pagãs à beira-mar, Gal Costa
e companhia nas "dunas do barato" de Ipanema etc.
Como contraponto à festa dionisíaca, referências nada veladas à
brutalidade dos tempos: opressão, tortura, insanidade e muito,
muito sangue.
Depois de 30 anos, a desfaçatez
do diretor agora vem amaciada
por um diálogo singular com a
cultura de massa.
Em "Um Lobisomem" reencontramos as marcas registradas do
diretor: as boazudas peladas, os
atores deliciosamente canastrões,
as referências ao universo do horror "científico" (Dr. Moreau,
Frankenstein), a subversão do
bom gosto burguês.
Uma turma de jovens urbanos
vai à Amazônia para conhecer o
santo-daime justamente quando
a região é abalada por mortes que
podem ter sido causadas por um
animal desconhecido.
O zoólogo americano Mr. Corman (Nuno Leal Maia) auxilia o
delegado Barreto (Toni Tornado)
nas investigações. Ao mesmo
tempo o Dr. Moreau (Paul
Naschy) desenvolve num laboratório clandestino pesquisas genéticas para criar uma raça de mutantes escravos e outra de superguerreiras amazonas.
Uma única cena pode servir de
aperitivo: depois de tomar um
chá alucinógeno, Natasha (Daniele Winitz) vê surgir na mata um
sacerdote inca, que canta e dança
para anunciar a natureza divina
da moça. O sacerdote é ninguém
menos que Sidney Magal. Dá para
não rir?
Um Lobisomem na Amazônia
Direção: Ivan Cardoso
Quando: amanhã, às 21h40, na Sala
UOL; e dias 28, às 22h30, no Cineclube
Vitrine; e 29, às 15h30, no Frei Caneca
Unibanco Arteplex
A Marca do Terrir
Direção: Ivan Cardoso
Quando: dia 27, às 22h30, na Sala
Cinemateca
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