São Paulo, sábado, 24 de janeiro de 2004

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SP 450

Na Ipiranga com São João, músico canta hoje com Zé Miguel Wisnik, Nando Reis, Jair Rodrigues, Jair Oliveira e Rappin" Hood

Com convidados, Caetano explica "Sampa"

MÁRVIO DOS ANJOS
DA REDAÇÃO

Talvez a maior expectativa de deslumbramento de um brasileiro que visite São Paulo pela primeira vez passe longe da av. Paulista, do edifício Copan ou da Igreja da Sé. É provável que, para muitos, o lugar que traduziria essa sensação seja uma simples esquina do centro da cidade: a que une as avenidas Ipiranga e São João.
Foi lá que algo aconteceu no coração de Caetano Veloso e deu ao cruzamento os versos mais famosos da canção "Sampa", de 1978. Tornada cartão-postal do imaginário nacional, a esquina recebe o compositor hoje, às 23h, para um show que comemora os 450 anos de São Paulo. O show não é inédito no local: o baiano já se apresentara ali em 1995.
Caetano, porém, recusa a "invenção" da esquina. "O lugar já era mencionado em "Ronda", de Paulo Vanzolini, cuja melodia eu também cito em "Sampa'", afirma. Na verdade, Vanzolini cita apenas a São João, sem a Ipiranga.
Existe alguma correção a ser feita na música, 26 anos depois? "O essencial de Sampa permanece. Acho que as correções necessárias foram feitas pelo Jair [Oliveira]", disse, rindo, referindo-se à canção "Uma Outra Beleza" do filho de Jair Rodrigues, espécie de "resposta" a "Sampa". Ambos são convidados de Caetano no show, que terá ainda Nando Reis, José Miguel Wisnik e Rappin" Hood.
Para Caetano, Jair Oliveira comentou "o estranhamento das estranhezas" que o baiano sentiu ao chegar à cidade, principalmente a "deselegância discreta" das paulistanas. "Havia, no meu caso, uma questão de classe: eu andava num ambiente de classe média para baixo, então havia essa deselegância. Eu não conhecia aqueles paulistas que consideram os outros como uma classe muito inferior, por terem mais dinheiro e mais viagens ao exterior", afirma.
Ainda sobre os estranhamentos de "Sampa", o compositor se recordou de quando conheceu a cidade, nos anos 60. "Cheguei com a [Maria] Bethânia, e a cidade nos pareceu feia, não parecia grande... nos pareceu provinciana, com aqueles cartazes de cinema de mau gosto. Tinha algo de cidade do interior", afirma, ressaltando que a canção é uma crônica da época. Segundo ele, os comentários sobre a cidade presentes na canção se tornaram com o tempo menos "indiscutíveis". "Hoje a paulistana já é pop, é Daslu, é São Paulo Fashion Week, e as meninas de São Paulo hoje são elegantes. Não eram!", exclama.

O show
Ao lado dos cinco convidados, Caetano disse que o show de hoje será marcado pelo despojamento. "Não estamos ensaiando há dois meses com uma banda. Não é um espetáculo de Las Vegas", disse, justificando o caráter intimista da apresentação -banquinho e violão. Ou violões, já que Nando Reis e Jair Oliveira confirmaram empolgados as presenças dos seus.
"O que não vai faltar são Jaíres", comentou Caetano, com humor, ao que Jair Rodrigues emendou: "Então é melhor "já ires" embora". A descontração foi marcante durante a entrevista coletiva.
Animadamente, Caetano e Jair Rodrigues trocam idéias sobre músicas que devem cantar no show. Além da confirmadíssima "Sampa", estarão lá "Lampião de Gaz", de Zica Bergami, sucesso de Inezita Barroso, e "São, São Paulo, Meu Amor", de Tom Zé, vencedora do festival de 68.
Os duos serão uma constante. "Nando Reis e eu estamos em dúvida se cantaremos "O Segundo Sol" ou "Relicário'", disse Caetano, que pediu a Jair Oliveira uma frasezinha de "Uma Outra Beleza", "Assum Branco" a Zé Miguel e "Tudo no Meu Nome" a Rappin" Hood. "Vai ser um prazer cantar um "sou negrão" com você", disse Caetano ao rapper, que agradeceu afirmando que, devido ao exílio, Caetano é contestador como um "rapper, só que anos à frente".


CAETANO VELOSO E CONVIDADOS.
Show em comemoração dos 450 anos de São Paulo. Onde: entre as av. Ipiranga e São João. Quando: hoje, às 23h. Grátis.



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