São Paulo, sexta-feira, 24 de março de 2000


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TEATRO
Estréia no Fringe "Pequenos Trabalhos Para Velhos Palhaços", de autor romeno inédito
Vida e arte de palhaços em crise

VALMIR SANTOS
enviado especial a Curitiba

"Pequenos Trabalhos para Velhos Palhaços" entra em cartaz hoje na mostra Fringe do Festival de Teatro de Curitiba. Peça e autor são inéditos no Brasil: trata-se de Matei Visniec, dramaturgo contemporâneo nascido na Romênia e naturalizado francês. Ele chega por meio do ator Alexandre David, que assistiu a montagem da obra na mostra "off" do Festival de Avignon, quatro anos atrás.
A estréia nacional em Curitiba tem direção de André Paes Leme ("Capital Federal"). Além de David, o elenco é formado por Augusto Madeira e Cláudio Simões, todos do Rio, onde cumprem temporada a partir de 11 de abril no teatro do Planetário, na Gávea.
Em "Pequenos Trabalhos...", o reencontro de três palhaços -Filipeto, Nicolau e Pepino- serve para rememorar os melhores momentos do ofício, pontuados pela amizade. Num segundo momento, porém, eles são guindados à realidade e têm de disputar entre si a vaga para "um velho palhaço", como pede o anúncio de um jornal.
"É quando os três percebem que estão num lugar decadente, opressivo, à espera do teste. Trocam elogios e se digladiam ao mesmo tempo, por conta da necessidade de sobreviver", afirma o ator Cláudio Simões, 31.
Pepino, o mais velho, adora recitar Shakespeare. Nicolau, o mais jovem, é especializado em pantomimas. Filipeto é um grande ilusionista. Cada um em sua habilidade, eles tentam abocanhar o ganha-pão.
"O que um velho palhaço pode oferecer senão seus velhos números?", eis o questionamento que os acomete. Não bastasse a crise social, deparam com a própria crise do circo. Cambalhotas, tropeções, tortas no rosto e o nariz vermelho, enfim, o território mágico do "ventre de lona" ainda é capaz de comover alguém? "Não deixa de ser uma metáfora do fazer artístico em todas as áreas", diz Simões.
A montagem brasileira acrescenta um prólogo interativo no qual os três atores realizam um sorteio de dados, com a cumplicidade da platéia, para ver quais papéis irão interpretar (eles ensaiaram para assumir qualquer um dos personagens).

"Beneditas"
A Cia. Confraria da Dança, de Campinas (SP), estréia no Fringe "Beneditas", uma releitura do sincretismo religioso brasileiro a partir da representação de santidades femininas: Nossa Senhora Aparecida, Imaculada Conceição, Nossa Senhora do Rosário e Iemanjá, entre outras.
Não é uma história linear. "Tudo é construído por meio de imagens de lembranças de festas populares, como a do Divino Espírito Santo, a congada, o reisado e outras manifestações tradicionais do interior", explica a dançarina Diane Ichimaru, 34, que criou, dirige e interpreta "Beneditas" ao lado de Grácia Navarro, 35, com quem contracena.
Ambas nasceram no interior paulista e trazem em sua formação a cultura de raiz popular -a primeira em Bragança Paulista e a segunda em Presidente Prudente. Em cena, também cantam e tocam percussão para dar vida às beneditas/benditas que entoam seus ditirambos em procissões, átrios de igreja, capelas ou terreiros de umbanda ou candomblé.
Segundo Diane, a pesquisa para o espetáculo "é da vida inteira", está impregnada na história pessoal das intérpretes. A sistematização dos estudos e da concepção coreográfica durou quatro meses, até a estréia, em setembro de 1998. Ela não gosta da definição de dança-teatro para o trabalho da Confraria, e tampouco se acomoda com a classificação de dança contemporânea. "São expressões que limitam muito, imprimem um rótulo", justifica. "Fazemos dança com base na pesquisa de linguagem da cultura popular." A Confraria foi criada em 1996 e "Beneditas" é seu primeiro trabalho.
Responsável por um dos melhores espetáculos encenados no ano passado em Curitiba -"A Boa", de Aimar Labaki -, o diretor Ivan Feijó marca presença no mesmo Fringe com "A Maçã de Eva", monólogo do casal italiano Dario Fo e Franca Rame, com interpretação de Clarice Abujamra, que já cumpriu temporada em SP.
São depoimentos de uma mulher, "uma espécie de Eurídice que viola todas as regras, substitui Orfeu e desce ao inferno em meio aos fantasmas do mal e do pecado para resgatar a sua melhor parte".


O jornalista Valmir Santos viaja a convite da organização do festival


Saiba mais sobre o Festival de Teatro de Curitiba na Internet, em www.uol.com.br/fol


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