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FESTIVAL DE TEATRO DE CURITIBA
Em "Nijinski", ator é Narciso
NELSON DE SÁ
enviado especial a Curitiba
Corre a lenda que um dia o diretor Antunes Filho, para mostrar a
um visitante o domínio da técnica
em seu elenco, chamou Luis Melo e
ordenou: "Chora". O ator imediatamente chorou. "Agora, pára." E
ele parou.
A piada lembra o monólogo "Nijinski", uma exibição de domínio
da interpretação que correu por
mais de uma hora e arrancou gritos de "bravo" no Festival de Teatro de Curitiba.
O impacto desde o início está nas
expressões do ator, que não busca,
nem poderia, é óbvio, dançar como Nijinski. Os semblantes, como
que num apanhado de emoções,
num teste do espelho, impressionam por sua interiorização -seja
lá o que representem.
Quando Melo começa a falar, inicia-se uma ladainha que pouco vai
se alterar, até o final. "Eu sou eu.
Nijinski é deus." Ou: "Eu sou o belo". Embora se reportem a um diário do próprio bailarino, trata-se, é
flagrante, do ator. (E vale dizer que
o diário de Nijinski acaba de ser
reeditado sem as intervenções de
sua mulher, que criaram muito do
mito do artista "louco" da peça.)
Para aceitar um significado real,
além da mera exposição de domínio técnico, é preciso acreditar que
o ator está levando o próprio exibicionismo ao limite, tornado arte. E
assim transforma uma frase qualquer que escreve em movimento,
verdadeiramente "belo". E quando
Nijinski, ou melhor, o ator se diz
um operário, um imperador,
"deus", trata-se também do "belo". "Eu sou tudo."
Mas o exibicionismo do ator alçado a poeta, tal concentração no
indivíduo, naquele monólogo de
um intérprete ensimesmado, mais
um monólogo sobre um louco, como tantos anteriores e de igual ostentação -é difícil, quando o espectador não se deixa levar pelo
fascínio, suportar "Nijinski". O
fauno tornou-se Narciso.
Por esse personagem, muito
mais do ator do que do bailarino, a
peça tem sua arte, mas a sequência
narcísea parece recusar a obra de
um poeta, a encenação, em suma, o
próprio teatro. Que não se entenda
mal: "Nijinski" desenvolveu uma
dramaturgia fragmentária de efeito, na adaptação de Doc Comparato. E leva à cena, pelas mãos das diretoras Rossella Terranova e Cláudia Schapira, uma precisão quase
obsessiva, por sinal, técnica.
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