São Paulo, sexta, 24 de abril de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CINEMA ESTRÉIAS
Oscar e Lucinda apostam tudo no delírio

THALES DE MENEZES
da Reportagem Local

Rapaz cresce debaixo de rigorosa educação religiosa. Adulto, divide sua crença em Deus com o vício de apostar, seja em cartas, corridas ou qualquer coisa. Ao ganhar, sente a força de uma bênção.
Jovem herdeira compra uma fábrica de vidros e inicia uma relação tortuosa com um padre. A garota transfere seu desejo sexual reprimido para um ímpeto febril de jogar, apostar. Arriscar sua fortuna é uma forma de purgação.
É na Austrália da virada do século que Oscar, o jogador, encontra Lucinda, a jogadora. Os dois vão trilhar uma jornada de amor irrealizado e devaneio crescente. Quanto mais reprimem seus desejos sexuais, mais se entregam a projetos alucinados.
No ápice do delírio, Oscar acredita que deve construir uma igreja de vidro e levá-la para o padre que Lucinda pensa ter amado. Para isso, não hesita em atravessar o inóspito deserto australiano, numa empreitada que vai decidir seu destino ao lado de Lucinda.
No breve resumo, é fácil perceber que "Oscar & Lucinda - Uma História de Amor e Loucura" está longe de ser um filme comum.
É baseado no livro "Oscar & Lucinda", de Peter Carey, lançado em 1988 e frequentador da lista dos mais vendidos nos países de língua inglesa. Carey também foi o roteirista de "Até o Fim do Mundo", de Wim Wenders.
As obras indicam um autor excêntrico, que teve a essência de seu trabalho captada pela diretora Gillian Armstrong. "Oscar & Lucinda" trata do questionamento da fé, de maneira bem humorada.
A fé de seus personagens não está restrita aos ditames da religião. Para Oscar e Lucinda, a vida reside em acreditar, seja qual for o objeto desse credo: Deus, amor e prazer, sorte e azar.
Para personificar o casal, a diretora precisava de atores capazes de interpretar pessoas alucinadas. E conseguiu tirar de Ralph Fiennes e da novata Cate Blanchett atuações apaixonadas.
Duas vezes indicado ao Oscar, por "A Lista de Schindler" e "O Paciente Inglês", Fiennes arrisca seu prestígio num personagem sem glamour, beirando o patético. Ao lado de uma atriz que deixou há pouco as aulas no Instituto de Arte Dramática de Sydney, ele despreza seu habitual estilo contido de representar.
O nome de Fiennes nos cartazes pode atrair um bom público aos cinemas. Sem dúvida, muita gente pode se decepcionar com essa obra delirante, que não faz concessões ao cinema comercial.
Há um tênue equilíbrio entre o delírio contagiante e a mais pura melancolia. Ninguém pode torcer pelos personagens, porque são imprevisíveis. Como todas as pessoas costumam ser no mundo real.
"Oscar & Lucinda" é desses filmes que ganham admiradores entre aqueles que gostam de ir ao cinema em busca de alguma reflexão sobre a vida.
Pode apostar.

Filme: Oscar & Lucinda - Uma História de Amor e Loucura Produção: EUA, 1997 Direção: Gillian Armstrong Com: Ralph Fiennes, Cate Blanchett Quando: a partir de hoje, nos cines Cinearte 2, Espaço Unibanco 4 e circuito


Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.