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CRÍTICA
Afiada como nunca, enquanto a música se dissolve
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL
Em afinação e confronto
com seu tempo, a quarentona
Madonna lança um disco chamado "Music" no momento em que
música se torna conceito em dissolução, ao menos da maneira como era conhecida até aqui, com o
aval e o cimento de uma indústria
das mais poderosas. Bem, Madonna, você não está sozinha.
Nós do lado de cá, analistas de
discos, talvez sejamos também, a
partir desta data histórica, espécie
em extinção. O conceito de "Music" está desmontado, suas faixas
se desgarraram, pode-se criticar
60%, 70% de seu novo CD.
É um momento notável na história da música pop e, também
-feliz coincidência-, na carreira de Madonna. OK, numa leitura
à George Orwell, pode ser que todo mundo pegue de graça, Madonna fique pobre e a Warner
Music vá à falência (hahaha, rirão
os críticos, antes do desemprego).
Mas, um segundo antes do big
bang, o mundo da música está
cheio de vida. Madonna é grátis e
-vamos à crítica- seu novo trabalho é o mais empolgado que já
fez. Recuperou-se da carolice pós-maternidade de "Ray of Light"
(98). Acostumou-se a ser mãe e
quer a música de volta para si.
Pois música é o que não falta em
"Music". Atravessado pela influência de William Orbit e por
efeitos de robotização e virtualização (e "napsterização", viu dona
Madonna?) da música, "Music" é
funk, é disco music, é pop, é folk, é
new wave anos 80 (sua origem,
afinal), é trip hop, é tecno, é Neil
Young e é Lenny Kravitz.
O CD (CD?) é 100% (100%?) futurista. Abusa de cibernética, vocoders, efeitos fofos. Reformulando digitalmente seus vocais hoje
quase perfeitos, Madonna localiza-se entre o pioneiro Kraftwerk
(citado evidentemente na faixa-título) e Cher (mãe da nova cafonice com o vocoder de "Believe").
Música borbulha no Carnaval à
americana "Amazing", na sensacional "Nobody's Perfect", em
"Paradise". Esta é o abismo negro:
traga new age, robôs, trilha de cinema antigo, Serge Gainsbourg,
"2001". Uau, Madonna nunca esteve tão afiada.
"Runaway Lover" é quase resumo. Kitsch-futurista, parece
"Guerra nas Estrelas", espada-laser. Parece a volta da Madonna de
"Like a Virgin" (84), a mais real de
todas as madonnas. Ao final, a faixa (faixa?) involui no efeito batido
de alguém pisando na tomada do
aparelho. Mas... Madonna vai pisar na tomada do Napster?
É aguardar os próximos rounds.
Está todo mundo no mesmo barco (submarino?). O mundo novo
chegou, diferente de Orwell e de
tudo que se imaginava. A música?
Por enquanto sobrevive.
Avaliação:
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