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"A SUPREMACIA BOURNE"
Diretor Paul Greengrass usa recursos como câmera na mão para dar credibilidade à continuação
Thriller recorre a clichês de documentários
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
Depois de amargar fracassos
retumbantes seguindo a fórmula do "franchise" cinematográfico, Hollywood constatou
que, para emplacar este sistema
de produção em série, não basta
contar com a força de uma marca
e o sucesso do primeiro filme.
É imperativo que a(s) seqüência(s) supere(m) o original, ou a
receita da bilheteria fácil pode desandar. É este, claramente, o esforço de "A Supremacia Bourne",
que chega aos cinemas prometendo ser a versão melhorada de "A
Identidade Bourne", de Doug Liman (2002).
É preciso entender essa vontade
de superação, antes de tudo, como um esforço de produção. A
nova aventura de Jason Bourne
(Matt Damon) é um "show off"
técnico, exibindo um incrível aparato capaz de oferecer mais ação,
mais frenesi, mais violência e
mais suspense.
A situação limite vivida pelo
personagem central -um assassino sem memória perseguido
por uma organização clandestina- é intensificada até as últimas
conseqüências, e uma vez que Jason Bourne e o espectador são absorvidos pela intensidade da ação,
serão sugados para um universo
privado de repouso.
Secundariamente, existe também o esforço da superação estética. A possibilidade de repouso é
igualmente recusada ao olhar do
espectador, que se confunde com
a "visão" do personagem central e
se submete a uma imagem instável, em movimento constante.
Não por acaso, o diretor contratado para essa continuação foi Paul
Greengrass, de "Domingo Sangrento" (2002). Neste filme sobre
o "Bloody Sunday", um dos mais
trágicos episódios da história recente irlandesa, Greengrass usou
o que se estabeleceu como o clichê
da estética documental (a câmera
na mão frenética, "envolvida" no
acontecimento) para dar credibilidade à sua reconstituição histórica. Esse mesmo aparato é usado
para tornar crível a fantasiosa trajetória de Bourne.
Demonstrando competência de
artesão, Greengrass se adapta perfeitamente à nova proposta. Ele
explora sua técnica para dar corpo ao universo muito específico e
fechado pelo qual circula Jason
Bourne. Trata-se de um filme de
espionagem globalizado, pós-Guerra Fria, em que a ação se desloca por várias cidades. Tudo começa na Índia, onde nosso herói,
ainda atormentado por não saber
sua real identidade, tenta levar
uma vida normal ao lado da namorada (Franka Potente). Após
um acontecimento trágico, ele
parte para a ação sem medir limites para descobrir quem o persegue e porquê. Passará por Londres, Amsterdã, Nápoles e, claro,
Berlim e Moscou, dois antigos
centros da Guerra Fria.
A partir daí, o caminho de
Bourne (ou seja, a narrativa do filme) é determinado na medida em
que ele descobre fatos e precisa
tomar decisões, como que movido por um "joystick" invisível.
Fisicamente não há mais "centro", as referências se dispersaram, o que se reflete no conflito
interno de Jason Bourne, um sujeito errante atormentado pela
falta de identidade. Conflito que
dá alguma humanidade a este autêntico personagem de videogame, nesta nova fórmula aplicada
ao gênero hollywoodiano dominante hoje, que é o filme de ação
"inteligente".
A Supremacia Bourne
The Bourne Supremacy
Direção: Paul Greengrass
Produção: EUA/Alemanha, 2004
Com: Matt Damon, Franka Potente
Quando: a partir de hoje nos cines Cine
Morumbi 3, Frei Caneca Unibanco
Arteplex 1 e circuito
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