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CRÍTICA
Artista aparece amarrada
da Reportagem Local
Só há a louvar o discurso verbal sinceramente desalentado
de Adriana Calcanhotto -é raro um artista manifestar qualquer possibilidade de insatisfação por um trabalho que acaba
de nascer.
Enquanto discursa, entretanto, Adriana não desconhece
que está a morder o próprio rabo. Se o que diz demonstra que
algo a acorrenta e imobiliza,
nas linhas do álbum "Maritmo" ela se debate o tempo todo
na impossibilidade de livrar as
amarras.
Reclama que sua geração é retrô -e é mesmo, ela tem razão-, mas ela própria já há alguns discos roda em círculo
num mesmo conjunto de referências -modernismo, antropofagia, concretismo, tropicália, os malditos- com que seus
pais, tios, avós e bisavós revolucionaram a cultura nacional.
Tanto tempo depois, não há
como não causar desânimo
-para não dizer repulsa-
uma canção como "Vamos Comer Caetano".
Não há ritual de devoração,
como ela pretende, mas de
aceitação passiva de velhos cânones. É fórmula repisada, declaração de impotência, ainda
mais entre samplers confusos
do autor, "concretices"
-"banquete-ê-mo-nos", "vamos revelarmo-nus"- e observações constrangedoras
-"nós queremos (...) o homem da Paulinha".
O que acompanha pretensas
ousadias como as citadas são
arranjos pop quase sempre
pasteurizados (como ocorre
em "Parangolé Pamplona",
uma bela canção maltratada
pelo tratamento dado pelo produtor Liminha), encontros estapafúrdios (na péssima "Mão
e Luva", cantada com Pedro
Luís e A Parede), dance music
mundana com intervenção injustificável do poeta maldito
Waly Salomão (em "Pista de
Dança").
Enumerativas, as letras de
Adriana (ouça, por exemplo,
"Maritmo" e "Canção por Acaso") continuam a se dividir em
(alguns) bons achados e (várias) odes banais a um mundo
tristonho e entediado.
O que transparece é que
Adriana é uma artista inibida, e
isso é muito humano. Por isso
ela se torna mais interessante
quando se despe de uma postura que tende ao forçadamente
"cult", ao blasé calculado.
Tal acontece na melodia inusitada -porque alegre- de
"Dançando" (de Péricles Cavalcanti), na aparentemente
antipática versão de "Por Isso
Corro Demais" (67), de Roberto Carlos, na melancolia tocante de "Vambora".
São sinais esparsos, e mais
evidente é o sinal de coragem
de Adriana ao não fingir o
mundo dourado das gravadoras. A guerra contra a irrelevância está na rua; Adriana
Calcanhotto e a "sagrada" MPB
precisam entrar em combate.
(PAS)
²
Disco: Maritmo
Artista: Adriana Calcanhotto
Lançamento: Sony
Quanto: R$ 18, em média
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