|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Masagão aponta seu dedo para o interior de Cunha
LÚCIA VALENTIM RODRIGUES
DA REDAÇÃO
Cunha, interior de São Paulo:
22.508 habitantes e um cinema. É
assim que começa "Nem Gravata
nem Honra", de Marcelo Masagão. Após "Nós que Aqui Estamos por Vós Esperamos" (1999),
em que quis contar uma "grande
história, em que o todo era o mais
importante", o cineasta investe
em pequenos dramas de moradores da cidadezinha paulista.
As diferenças entre homens e
mulheres transparecem nas vozes
do delegado, do taxista, da cabeleireira, do casal à beira da separação, de um homossexual assumido. "Escolhi um lugar pequeno
justamente para explorar uma sociedade patriarcal, em que as instituições se confundem com as
pessoas que as representam."
Masagão vai justapondo depoimentos a comparações numéricas. "Não tem uma história fixa. É
um conhecimento pela acumulação. A cada dois minutos, troco de
fragmento, porque cada pessoa
vai se identificar com um pedaço
do filme. Acho muito chato o jeito
normal de fazer narrativas."
Também não gosta da definição
de documentário: "Faço filmes,
não tenho uma preocupação com
o real. É um recorte, é o meu dedo
que estou apontando ali. Retratei
uma envesgada e limitada visão
da realidade", diz Masagão, de seu
escritório em Cotia (SP), onde fica
a sede do Festival do Minuto, do
qual é idealizador e diretor.
A versão exibida na Mostra é diferente da que foi apresentada no
É Tudo Verdade, em abril. "Fiz
umas 200 versões", exagera. "É o
meu jeito de fazer filmes. Só dei
por finalizado quando mostrei o
filme para aquelas pessoas que tinham participado dele."
Cada morador de Cunha assistiu ao longa separadamente, enquanto Masagão captava a reação
das pessoas a seus depoimentos
da tela. Depois fundiu filme, em
cores, e reação, em preto-e-branco. "É interessante perceber como
os espectadores ficam muito mais
ligados naquele quadradinho sem
cores. Há um espectador vendo o
filme com você, na própria tela."
Na hora de dizer sua opinião sobre a diferença entre homens e
mulheres, ele se esquiva: "Não
tem como definir. Quis levantar
uma questão. A dubiedade é mais
interessante do que o fato".
Sobre as críticas negativas já recebidas pelo filme, o diretor não
acha de todo ruim: "Gosto da discussão de onde o filme pegou e
onde não pegou. Afinal, fiz uma
experiência audiovisual".
Além do Festival do Minuto,
que acontece de 6 a 13 de novembro, Masagão já prepara dois novos projetos. O primeiro, em fase
de finalização, é "Um Pouco Mais,
um Pouco Menos", curta de 17
minutos em parceria com Gustavo Steinberg sobre São Paulo. A
estatística está novamente presente. "Tenho obsessões. A briga
com a estatística é uma delas."
A idéia é levar o projeto para outras cidades. "Em São Paulo, tudo
foi rodado em preto-e-branco e a
câmera ficou quase a 90 graus o
tempo todo, para dar a sensação
de verticalização, de falta de horizonte. Se fizermos no Rio, vai ser
um plano aberto e tudo colorido."
Em fase de roteirização, está
"1,99: O Império da Nebulosa",
sobre o consumismo desenfreado, em que "o atrativo é o preço,
não a mercadoria em si".
Texto Anterior: Crítica: Documentário estilhaça janela da alma Próximo Texto: Crítica: Falta de apuro do diretor chega a comover Índice
|