São Paulo, quarta-feira, 24 de outubro de 2001

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Masagão aponta seu dedo para o interior de Cunha

LÚCIA VALENTIM RODRIGUES
DA REDAÇÃO

Cunha, interior de São Paulo: 22.508 habitantes e um cinema. É assim que começa "Nem Gravata nem Honra", de Marcelo Masagão. Após "Nós que Aqui Estamos por Vós Esperamos" (1999), em que quis contar uma "grande história, em que o todo era o mais importante", o cineasta investe em pequenos dramas de moradores da cidadezinha paulista.
As diferenças entre homens e mulheres transparecem nas vozes do delegado, do taxista, da cabeleireira, do casal à beira da separação, de um homossexual assumido. "Escolhi um lugar pequeno justamente para explorar uma sociedade patriarcal, em que as instituições se confundem com as pessoas que as representam."
Masagão vai justapondo depoimentos a comparações numéricas. "Não tem uma história fixa. É um conhecimento pela acumulação. A cada dois minutos, troco de fragmento, porque cada pessoa vai se identificar com um pedaço do filme. Acho muito chato o jeito normal de fazer narrativas."
Também não gosta da definição de documentário: "Faço filmes, não tenho uma preocupação com o real. É um recorte, é o meu dedo que estou apontando ali. Retratei uma envesgada e limitada visão da realidade", diz Masagão, de seu escritório em Cotia (SP), onde fica a sede do Festival do Minuto, do qual é idealizador e diretor.
A versão exibida na Mostra é diferente da que foi apresentada no É Tudo Verdade, em abril. "Fiz umas 200 versões", exagera. "É o meu jeito de fazer filmes. Só dei por finalizado quando mostrei o filme para aquelas pessoas que tinham participado dele."
Cada morador de Cunha assistiu ao longa separadamente, enquanto Masagão captava a reação das pessoas a seus depoimentos da tela. Depois fundiu filme, em cores, e reação, em preto-e-branco. "É interessante perceber como os espectadores ficam muito mais ligados naquele quadradinho sem cores. Há um espectador vendo o filme com você, na própria tela."
Na hora de dizer sua opinião sobre a diferença entre homens e mulheres, ele se esquiva: "Não tem como definir. Quis levantar uma questão. A dubiedade é mais interessante do que o fato".
Sobre as críticas negativas já recebidas pelo filme, o diretor não acha de todo ruim: "Gosto da discussão de onde o filme pegou e onde não pegou. Afinal, fiz uma experiência audiovisual".
Além do Festival do Minuto, que acontece de 6 a 13 de novembro, Masagão já prepara dois novos projetos. O primeiro, em fase de finalização, é "Um Pouco Mais, um Pouco Menos", curta de 17 minutos em parceria com Gustavo Steinberg sobre São Paulo. A estatística está novamente presente. "Tenho obsessões. A briga com a estatística é uma delas."
A idéia é levar o projeto para outras cidades. "Em São Paulo, tudo foi rodado em preto-e-branco e a câmera ficou quase a 90 graus o tempo todo, para dar a sensação de verticalização, de falta de horizonte. Se fizermos no Rio, vai ser um plano aberto e tudo colorido."
Em fase de roteirização, está "1,99: O Império da Nebulosa", sobre o consumismo desenfreado, em que "o atrativo é o preço, não a mercadoria em si".


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