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Crítica/"Como Eu Festejei o Fim do Mundo"
Queda de ditador romeno é vista com humor
SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA
Retratos do ditador romeno Nicolae Ceausescu (1918-1989) aparecem em ambiente escolar, como um Big Brother à espreita
de crianças e jovens, no início
de "Como Eu Festejei o Fim do
Mundo". São imagens de um
Ceausescu jovial, a sugerir que
ainda se vive o início de seu período sangrento no governo.
Pura ilusão, logo desfeita: estamos em 1989, o derradeiro
dos quase 25 anos em que ele
impôs ao país seu regime de
terror. O próprio ditador já era
um decrépito incapaz de notar
que o barco afundava. Os usos e
costumes, no entanto, ainda
ecoavam os velhos tempos.
Em seu primeiro longa-metragem como diretor, chancelado por Martin Scorsese e Wim
Wenders como produtores
executivos, o romeno Catalin
Mitulescu (que ganhou a Palma
de Ouro em Cannes com o curta "Trafic", em 2004) faz a anatomia da derrocada de Ceausescu, mas da perspectiva de
uma criança, Lalalilu (Timotei
Duma), e de sua irmã mais velha, Eva (Doroteea Petre).
Ambos freqüentam uma escola cujo ambiente autoritário
procura reproduzir os valores
do regime. A "camarada professora" se impõe aos alunos como
se fosse um delegado do Partido Comunista, e os jovens, estimulados a delatar e a perseguir
colegas, banem Eva por causa
de um episódio acidental de
afronta simbólica ao poder.
Em uma aula de música, adolescentes se preparam para
uma cerimônia oficial e ensaiam uma canção cujos primeiros versos falam que "nosso
país é nosso". Naquele momento, parece ironia. Mais um pouco, no entanto, e a letra vai adquirir caráter profético, devidamente trabalhado pelo filme.
Ao examinar como o germe
da ditadura encontra na escola
um ambiente amplamente favorável à sua reprodução, Mitulescu se aproxima do albanês
"Slogans" (2001), de Gjerji
Xhuvani, abordagem bem-humorada do culto à figura de Enver Hoxha (1908-1985), que governou a Albânia com mão de
ferro durante 40 anos.
"Como Eu Festejei o Fim do
Mundo" também encontra no
humor a alternativa para tornar mais leve (e palatável a um
público mais amplo) a leitura
do contexto político. Lalalilu,
seu dente de leite (destinado a
lhe dar sorte em momento crucial da história) e os dois companheiros de travessuras estão
ali para criar um tom onírico.
Eva tem outra função: vítima
do estado de coisas, tanto na escola quanto em casa, ela incorpora a consciência política em
formação - alterna a companhia de dois jovens que buscam
modos de afrontar o sistema,
cada um à sua maneira- e o desejo de tocar a vida em outro
quadrante.
Não é ocasional que, entre as
metáforas usadas por Mitulescu, as principais se refiram a
meios de transporte: o trilho de
trem que passa à margem de todos; uma carcaça de automóvel
que leva seus passageiros a viagens imaginárias a outros países; e, por fim, um navio em alto-mar, símbolo de um tempo
em que a palavra liberdade volta ao dicionário.
COMO EU FESTEJEI O FIM DO MUNDO
Direção: Catalin Mitulescu
Quando: hoje, às 16h40, na Sala UOL
de Cinema; amanhã, às 19h, no Cinemark Metrô Santa Cruz sala 9
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