São Paulo, sábado, 24 de outubro de 1998

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Wonderbra


Livro "Sutiãs e Espartilhos" conta a história da evolução da moda íntima que modela o corpo desde a Antiguidade


da Reportagem Local

"Contém os fortes, sustenta os fracos, reúne os dispersos" diz, já no século 17, o slogan para espartilho mais antigo de que se tem registro na história.
A frase, cheia do humor associado às peças que transformaram os corpos femininos ao longo da história, está no livro "Sutiãs e Espartilhos - Uma História de Sedução", lançado no Brasil.
Escrito pela francesa Béatrice Fontanel em 1992, com patrocínio da Du Loren, o livro pretende contar, em 160 páginas permeadas por centenas de imagens, a evolução da roupa de baixo da mulher das civilizações pré-cristãs até o advento do "wonderbra", sutiã que padroniza o tamanho dos seios bem ao gosto opulento e empinado da década de 90.
Até a virada para o século 20, mulheres de todo o mundo não tinham outra opção senão utilizar o princípio do espartilho para empinar os seios. Ao apertar cintura e estômago, as armaduras de tecido e barbatanas pressionavam as mamas para cima.
De acordo com Fontanel, a primeira a inverter essa idéia, desenhando uma peça especificamente para suspender o busto por meio de alças apoiadas nos ombros, foi a a francesa Heminie Cadolle, em 1889, na Exposição Universal.
Até isso acontecer, no entanto, os espartilhos reinaram soberanos.
Por muito tempo, eram desenhados e confeccionados unicamente por homens. Nem conforto, nem bem-estar físico eram prioridades, mas a peça passava por transformações tecnológicas, usando como base o ferro, barbatanas de tubarão e aço inoxidável. Até polias eram usadas, como atesta o livro.
"Na Exposição de 1823 apresenta-se pela primeira vez o espartilho mecânico! Trata-se de um espartilho com polias, não uma especialidade para sado-masoquistas, mas um modelo muito elaborado que pode ser atado e destado sem a ajuda de outra pessoa".
Não era de fato um sado-masoquismo consentido, mas algumas "mulheres-vespas", com cinturas marcadíssimas, chegaram até a morrer em busca da silueta ideal.
Dizia um jornal de 1859, segundo citação do livro: "Uma jovem mulher, da qual todas as rivais admiravam a cintura fina, morreu dois dias após o baile. A família quis saber a causa dessa morte súbita, em tão tenra idade, e decidiu praticar uma autópsia. O resultadofoi surpreendente. O fígado havia sido perfurado por três costelas! Eis como se pode morrer aos 23 anos, não de tifo, nem de parto, mas por causa de um espartilho".
Essas curiosidades são o melhor do texto de Fontanel. Abordada sem arroubos feministas, a história do sutiã e do espartilho transforma-se num compêndio de costumes influenciados por mudanças políticas, como a Revolução Francesa, e a chegada das mulheres às fábricas, durante as guerras mundiais.
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Sutiã, enfim É em 1913, nos Estados Unidos, que o primeiro sutiã moderno aparece. Contrária ao uso do espartilho, a nova-iorquina Mary Phelps Jacob, conhecida como Caresse Crosby, costura seu porta-seios com lenços e fitas, com a ajuda de uma empregada francesa.
A moda ainda não pega, ela acaba vendendo sua patente para os irmãos Warner (não os do cinema, apenas homônimos), que se tornariam ricos com a lingerie.
Estão compilados também uma série de anúncios de roupa íntima feminina, além de desenhos de corpetes, espartilhos e das hastes e tipos de fechos que os recheavam.
Nos anos 20, de liberação, tomam a forma de "corpinhos", para achatar os seios A criação de novos tecidos, como o raiom, a popularização da renda produzida agora em grandes quantidades, torna ainda mais acessível a diversas classes sociais o uso do sutiã.
A moda aparece, nesse retrato feito por Fontanel, como uma ditadora implacável que achata, empina, comprime, arredonda ou alonga a silueta respeitando apenas os limites da moral de cada época, mas sem outra razão mais profunda. É bonito porque assim se diz.
Para perceber isso, basta olhar as imagens ao longo do tempo.
Deusas gregas, mulheres medievais, renascentistas, revolucionárias, freiras, nobres, burguesas, sufragistas, operárias, atrizes de cinema e super-modelos são os ícones dessa epopéia de beleza.
Entre as mulheres famosas que foram incluídas nessa história, estão a espiã Mata-Hari, a bailarina Isadora Duncan, a atriz de Hollywood Katherine Hepburn, e, é claro, Madonna.
Apenas uma brasileira está retratada. Roberta Close aparece no capítulo "As Roupas de Baixo Intergalácticas", entre Madonna ostentando o corpete de bojos pontudos de Jean-Paul Gaultier, e Naomi Campbell, desfilando um modelo Buick de Thierry Mugler.
(PATRICIA DECIA) ˛

Livro: Sutiãs e Espartilhos - Uma História de Sedução Autora: Béatrice Fontanel Lançamento: Salamandra Quanto: R$ 45 (160 págs.)


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