|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"A HISTÓRIA DE ADELE H."
Truffaut nos lembra de que amava as mulheres
DA REDAÇÃO
A confusão entre clássico e
acadêmico, a que os filmes
de época são tão vulneráveis, abateu-se a seu tempo sobre "A História de Adele H", que François
Truffaut filmou em 1975 a partir
dos diários de Adele (1830-1915),
filha do escritor Victor Hugo.
Digamos para simplificar que
acadêmico é o filme em que o diretor chama a época representada
de vossa senhoria; clássico é
quando a chama de você. Truffaut
está entre os que a chamam de você: o tempo representado é um
quadro, não um signo, a época
define um modo de ser, mas não
acrescenta valor à produção.
Nesse sentido, "Adele H" é um
filme em que se sobressai a arte do
"fade out" -essa figura que consiste no escurecimento do quadro
ao final de certas cenas. O acadêmico valoriza o escurecimento,
enfatizando os cenários e figurinos. Aqui, quando o plano é geral,
normalmente o escurecimento é
rápido, não dá tempo ao espectador de perceber "a época". Quando, ao contrário, o plano está fechado nos atores -ocupado com
seus pensamentos ou sentimentos-, é quase sempre lento.
Dito isso, "Adele H" trabalha
duas linhas perceptíveis de imediato. Uma diz respeito à mulher
obcecada por Pinson, tenente britânico. Por ele, Adele (Isabelle
Adjani) atravessa o Atlântico para
chegar a Halifax (hoje Canadá),
em 1861. Pinson, bonitão, mulherengo, jogador, lhe havia prometido casamento. Não quer mais
nada com ela. Adele não se dá por
vencida e persegue-o implacavelmente. Por vezes, lembra essas
anti-heroínas que, em vez de seduzir o amante, o aterrorizam.
A segunda linha, menos interessante, é a do amor romântico, visto aqui como patologia. Adele leva-o às últimas consequências.
Existe ainda uma interessante
discussão sobre verdade narrativa
e verdade da narrativa (embora
desenvolvida com êxito apenas
em certos momentos, como na
cena do hipnotizador).
Truffaut agita por fim a questão
feminista. É o aspecto menos sincero do filme. Embora Adele reivindique para si o papel de mulher livre, capaz de mover mundos e fundos por seu amor, a simpatia do realizador por essa atitude parece mais de ocasião do que
outra coisa. O tipo de atitude de
Truffaut em relação à mulher é
mais o de "O Homem Que Amava
as Mulheres", título que diz bem
de suas convicções. No fundo,
Adele Hugo é Truffaut. O Truffaut
que, por amor a Catherine Deneuve, acabou internado em uma
clínica de saúde. O feminismo
tem pouco a ver com isso.
(IA)
A História de Adele H
L'Histoire de Adèle H
Direção: François Truffaut
Produção: França, 1975
Com: Isabelle Adjani e Bruce Robinson
Quando: a partir de hoje no Top Cine
Texto Anterior: Câmera cega reensina a ver Próximo Texto: Festival de Brasília: Lúcia Murat inverte o mito de Iracema Índice
|