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CINEMA/ESTRÉIAS
"O GOSTO DOS OUTROS"
Em seu filme de estréia na direção, francesa também atua e divide roteiro com protagonista
Agnès Jaoui faz desafio à idiossincrasia
FRANCESCA ANGIOLILLO
DA REPORTAGEM LOCAL
Se o inferno nem sempre são os
outros, certamente o gosto dos
outros pode assumir um peso infernal nos confrontos sociais. É isso que nos diz "O Gosto dos Outros", primeiro filme da francesa
Agnès Jaoui, 37.
Foi um pouco por uma questão
de gosto que a francesa Jaoui se
lançou à direção de filmes, depois
de participar como atriz em uma
dezena deles.
"Eu atuava, gostava, mas ficava
pensando que faria as coisas de
outro modo", diz Jaoui à Folha,
em passagem pelo Brasil para divulgar o filme, que chega hoje a
salas do Rio e de São Paulo.
Ela reitera, porém, que a idéia
de dirigir veio mais ou menos naturalmente depois que ela começou a escrever para teatro e, posteriormente, para cinema.
"Comecei a escrever porque eu
tinha coisas a dizer e também porque não encontrava trabalho suficiente como atriz. Foi por vontade, mas muito por necessidade.
Pouco a pouco, comecei a pensar
em dirigir."
Em todos os roteiros e textos
teatrais que escreveu, Jaoui teve a
companhia do também ator Jean-Pierre Bacri. Antes de chegar ao
argumento de "O Gosto dos Outros", a dupla tentara sair do universo das relações humanas que
dominava seus escritos para
construir uma trama policial.
"Depois de dois ou três meses,
não conseguíamos escrever nada
que não fosse clichê", lembra
Jaoui. "Então decidimos parar e
recomeçar a partir daquilo a que
estávamos habituados." Revirada
a idéia original, ficaram alguns
personagens, como o do próprio
Bacri -o empresário Castella.
O cerne da trama são as discussões sobre tolerância. A questão
se irradia para as relações pessoais
dos outros personagens, todos ligados de algum modo a Castella
-um sujeito "pouco refinado",
apesar do dinheiro.
Num esforço por "melhorar",
Castella tenta aprender inglês e,
mesmo sem aceitar de bom grado
a língua de Shakespeare, se encanta com a professora -uma
atriz de teatro que usa as aulas para complementar o soldo.
Obcecado por atrair sua atenção, tenta de todo modo entrar
para seu círculo -atores, produtores, artistas plásticos-, mas
seu jeito simplório não ajuda.
"Preconceitos estão em todo lugar. Talvez cada um de nós tenha
a impressão de não os ter. Mas,
mesmo nos meios mais cultos, artísticos, supostamente abertos, temos preconceitos enormes", diz a
diretora. "No confronto com o
outro, sempre temos medos e certezas antes de começar um diálogo. Ainda que não seja consciente,
eu olho como você se veste. Ninguém está livre disso."
Jaoui conta que teve medo do
acúmulo de funções no filme
-além de escrever e dirigir, ela
vive a garçonete Manie, amiga de
Clara, e, depois, namorada do
guarda-costas de Castella.
Relaxou quando percebeu que
"sabia o que queria dizer, afinal" e
que atuar era um prazer, comparado à tensão da estréia atrás das
câmeras.
Medos à parte, parece que Jaoui
conseguiu o impossível: tocar o
gosto de todos. O filme acumulou
nomeações e prêmios, entre os
quais quatro César -maior prêmio do cinema francês- e a indicação ao Oscar de melhor filme
estrangeiro, em 2001. "Acho que
se sentir desprezado ou ignorado
é uma experiência comum a todo
mundo", tenta explicar Jaoui.
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