São Paulo, sexta-feira, 25 de janeiro de 2002

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CRÍTICA

Diretora retrata a intolerância que a diversidade esconde

CÁSSIO STARLING CARLOS
EDITOR DO FOLHATEEN

O cinema francês pós-nouvelle vague é muitas vezes acusado de ser excessivamente falado, de ter muito blablablá intelectualizado e pouco cinema ou, em poucas palavras, de ser chato. "O Gosto dos Outros", estréia da roteirista e atriz Agnés Jaoui na direção, mantém a tradição. E, ao contrário de muitos de sua geração, é muito divertido.
Jaoui e seu marido, Jean-Pierre Bacri, já contavam com um excelente currículo como roteiristas -assinaram duas deliciosas comédias recentes do decano Alain Resnais ("Smoking/No Smoking" e "On Connaît la Chanson")- antes de ela se aventurar na direção. E optou por um filme sem riscos, ciente de suas qualidades e segura em seu terreno.
Não se trata de um filme de autor, e sim de atores, em particular, de roteiristas (Jaoui e Bacri também atuam no filme).
Castella (Bacri) é um empresário suburbano de meia-idade, casado com uma decoradora para a qual animais têm mais sentimentos que humanos. O casamento morno perde o rumo quando ele se apaixona por uma atriz (Anne Alvaro, estupenda), que nas horas vagas é sua professora de inglês.
Manie (Jaoui) é uma garçonete, protótipo da mulher liberada, que se apaixona por um guarda-costas bronco. O romance esbarra na implicância de seu amante com o fato de ela traficar haxixe.
Como anuncia o título, o gosto é o centro dessa comédia de erros. Seu motor é o desencontro social e, sobretudo, afetivo que a não coincidência de gostos provoca. E seu alvo são os códigos, ingresso obrigatório para participar do universo "culto" e "sofisticado" que delimita os grupos urbanos autodenominados "modernos".
Um "mundinho" não se comunica com o outro. Para ir de um "mundinho" ao outro é obrigatório uma especialização, adequar-se ao novo território, adaptar o comportamento, o discurso, a aparência. A regra predominante é "seja idêntico a nós ou não seja ninguém". Essa fórmula já resume o grau de "liberalidade" dos grupos sociais na visão de Jaoui. Com graça e elegância, insinua que diversidade demais é puro disfarce para tolerância de menos.


O Gosto dos Outros
Les Goût des Autres
   
Direção: Agnés Jaoui
Produção: França, 2001
Quando: a partir de hoje nos cines Belas Artes, Espaço Unibanco e circuito




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