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CRÍTICA
Diretora retrata a intolerância que a diversidade esconde
CÁSSIO STARLING CARLOS
EDITOR DO FOLHATEEN
O cinema francês pós-nouvelle vague é muitas vezes
acusado de ser excessivamente falado, de ter muito blablablá intelectualizado e pouco cinema ou,
em poucas palavras, de ser chato.
"O Gosto dos Outros", estréia da
roteirista e atriz Agnés Jaoui na
direção, mantém a tradição. E, ao
contrário de muitos de sua geração, é muito divertido.
Jaoui e seu marido, Jean-Pierre
Bacri, já contavam com um excelente currículo como roteiristas
-assinaram duas deliciosas comédias recentes do decano Alain
Resnais ("Smoking/No Smoking"
e "On Connaît la Chanson")-
antes de ela se aventurar na direção. E optou por um filme sem
riscos, ciente de suas qualidades e
segura em seu terreno.
Não se trata de um filme de autor, e sim de atores, em particular,
de roteiristas (Jaoui e Bacri também atuam no filme).
Castella (Bacri) é um empresário suburbano de meia-idade, casado com uma decoradora para a
qual animais têm mais sentimentos que humanos. O casamento
morno perde o rumo quando ele
se apaixona por uma atriz (Anne
Alvaro, estupenda), que nas horas
vagas é sua professora de inglês.
Manie (Jaoui) é uma garçonete,
protótipo da mulher liberada, que
se apaixona por um guarda-costas bronco. O romance esbarra na
implicância de seu amante com o
fato de ela traficar haxixe.
Como anuncia o título, o gosto é
o centro dessa comédia de erros.
Seu motor é o desencontro social
e, sobretudo, afetivo que a não
coincidência de gostos provoca. E
seu alvo são os códigos, ingresso
obrigatório para participar do
universo "culto" e "sofisticado"
que delimita os grupos urbanos
autodenominados "modernos".
Um "mundinho" não se comunica com o outro. Para ir de um
"mundinho" ao outro é obrigatório uma especialização, adequar-se ao novo território, adaptar o
comportamento, o discurso, a
aparência. A regra predominante
é "seja idêntico a nós ou não seja
ninguém". Essa fórmula já resume o grau de "liberalidade" dos
grupos sociais na visão de Jaoui.
Com graça e elegância, insinua
que diversidade demais é puro
disfarce para tolerância de menos.
O Gosto dos Outros
Les Goût des Autres
Direção: Agnés Jaoui
Produção: França, 2001
Quando: a partir de hoje nos cines Belas
Artes, Espaço Unibanco e circuito
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